247 ADVERTE: APOSTA NO PESSIMISMO É ELEITORAL
Em sua coluna no Globo, a jornalista Miriam Leitão entrevista o economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica de FHC, que fala em desânimo generalizado no setor empresarial; detalhe: a análise de Mendonça de Barros não é absolutamente isenta; neste mês de dezembro, ele passou a integrar o time de economistas do presidenciável tucano Aécio Neves (o que ela não diz aos seus leitores); número divulgado hoje pela FGV aponta justamente o inverso: a confiança dos empresários cresceu
26 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 10:45
247 - No dia 14 de dezembro deste ano, o colunista Lauro Jardim, de Veja, anunciou a contratação de um "peso-pesado" pelo time do senador Aécio Neves (PSDB-MG). Eis a nota:
O time
Aécio Neves agregou um novo peso-pesado ao seu time de economistas, que já conta na linha de frente com Armínio Fraga: José Roberto Mendonça de Barros.
Ex-secretário de Política Econômica do ex-presidente FHC, Mendonça de Barros é um economista afável, respeitado, mas o governo ao qual serviu não foi marcado, propriamente, por um ciclo de prosperidade e alto crescimento. Predominava o que seu irmão, Luiz Carlos Mendonça de Barros, que seria ministro da Produção no segundo governo FHC se não tivesse sido abatido pelos grampos do BNDES, chamava de "voo de galinha".
Até aí, nada demais. No entanto, neste domingo, Mendonça de Barros é o entrevistado da coluna de Miriam Leitão, no Globo, onde ele fala de um suposto risco de desânimo generalizado entre os empresários. “As empresas se convenceram de que o país vai continuar crescendo pouco e, por isso, estão reduzindo investimentos e determinando cortes de gastos. Isso preocupa porque adia a recuperação”, diz ele.
Na verdade, os números mostram o contrário. Uma sondagem da Fundação Getúlio Vargas aponta que a confiança empresarial, em vez de cair, subiu (leia mais aqui). Além disso, economistas, como Delfim Netto, passaram a prever crescimento superior a 3% em 2014 e empresários, como Abilio Diniz, reforçaram a aposta no otimismo em 2014 – ano em que a economia será naturalmente estimulada pela Copa e pelas eleições. Ou seja: o risco de "tempestade perfeita" parece ser cada vez menor (leia mais aqui). Além disso, nunca é demais reler o anúncio publicado pela BMW sobre sua decisão de investir no Brasil, contra o vaticínio de derrotistas (leia aqui), como parece ser o caso de Mendonça de Barros.
Que Miriam Leitão o entreviste, ok. Mas ela deveria advertir o leitor que ele faz parte da equipe do principal candidato oposicionista.
Abaixo, a coluna de Miriam Leitão:
Risco do desânimo
O economista José Roberto Mendonça de Barros disse que houve, no segundo semestre deste ano, uma rápida deterioração das expectativas dos empresários. “As empresas se convenceram de que o país vai continuar crescendo pouco e, por isso, estão reduzindo investimentos e determinando cortes de gastos. Isso preocupa porque adia a recuperação.”
Ele disse que, nos contatos com empresas de várias áreas, notava que a previsão que faziam era de um período curto de baixo crescimento; agora a perspectiva mudou.
— Isso altera o comportamento da empresa, que em vez de ficar em compasso de espera, toma decisões como a de não dar descontos, reduzir custos drasticamente, postergar investimentos. Isso sozinho já produz o efeito negativo de manter o baixo crescimento — diz José Roberto, da MB Associados.
A consultoria dele está prevendo um crescimento de 1,9% no ano que vem. O que é um pouco menos do que este ano. A inflação deve ficar em 6%.
A agricultura, segundo Mendonça de Barros, não deve repetir o forte crescimento de dois dígitos de 2013.O número deste ano foi resultado em parte do bom desempenho do setor, mas também do fato de que a produção foi comparada com uma base baixa do ano anterior. Na indústria, não deve ser diferente:
— O setor automotivo vai trabalhar com uma sobra de 1,5 milhão de veículos, quando todas as fábricas estiverem funcionando. Já está atualmente com estoque.
O balanço de pagamentos deve ser beneficiado pela desvalorização cambial mais acentuada, que vai impulsionar as exportações e reduzir importações. Por outro lado, será um empurrão a mais na inflação.
— A política monetária vai depender do câmbio — acredita Mendonça de Barros.
O economista sustenta que pior do que os números fracos é o ambiente negativo entre empresas provocado por vários problemas que foram se acumulando. Um deles, a situação crítica do setor elétrico:
— Com o perdão da expressão, mas o setor elétrico está em estado de choque. Descapitalizado, sem horizonte para investir e sem saber quando a situação se normaliza após a intervenção do ano passado. A Petrobras também está descapitalizada. Esses são dois pesos importantes para a economia. Nós estamos acumulando problemas em várias áreas — disse.
Desse tipo de questão se fala em virada de ano, para que seja corrigida. Há o que fazer para aumentar o ânimo desses empresários que estão pondo investimentos na gaveta. Mendonça de Barros disse que as concessões licitadas, mesmo sendo feitas “no apagar das luzes”, destravou um pouco o investimento.
O ano de 2014 é eleitoral e normalmente o governo aumenta o gasto para tentar produzir um clima de mais otimismo. Se isso acontecer, terá o efeito inverso: de piorar as expectativas dos empresários já preocupados com a questão fiscal. Atualmente, esse tema assusta até os economistas que costumavam defender a política econômica.
O temor do governo é de que haja um rebaixamento da nota do Brasil em 2014. Economistas que ouvi acham que, por ser um ano eleitoral, as agências vão preferir adiar. Elas já alertaram. Não vão querer provocar maiores tremores no ano que vem.
Mas se o quadro fiscal continuar se deteriorando, na visão de Mendonça de Barros, o ano de 2015 também será difícil. O país estaria então completando o quinto ano de baixo crescimento e sob o risco de rebaixamento da nota. Por isso, o melhor seria começar a ajustar as contas já no ano que vem, mesmo sendo um ano eleitoral. O maior dos riscos, no entanto, é continuar esse desânimo entre os empresários, detectado por Mendonça de Barros.
Ele disse que, nos contatos com empresas de várias áreas, notava que a previsão que faziam era de um período curto de baixo crescimento; agora a perspectiva mudou.
— Isso altera o comportamento da empresa, que em vez de ficar em compasso de espera, toma decisões como a de não dar descontos, reduzir custos drasticamente, postergar investimentos. Isso sozinho já produz o efeito negativo de manter o baixo crescimento — diz José Roberto, da MB Associados.
A consultoria dele está prevendo um crescimento de 1,9% no ano que vem. O que é um pouco menos do que este ano. A inflação deve ficar em 6%.
A agricultura, segundo Mendonça de Barros, não deve repetir o forte crescimento de dois dígitos de 2013.O número deste ano foi resultado em parte do bom desempenho do setor, mas também do fato de que a produção foi comparada com uma base baixa do ano anterior. Na indústria, não deve ser diferente:
— O setor automotivo vai trabalhar com uma sobra de 1,5 milhão de veículos, quando todas as fábricas estiverem funcionando. Já está atualmente com estoque.
O balanço de pagamentos deve ser beneficiado pela desvalorização cambial mais acentuada, que vai impulsionar as exportações e reduzir importações. Por outro lado, será um empurrão a mais na inflação.
— A política monetária vai depender do câmbio — acredita Mendonça de Barros.
O economista sustenta que pior do que os números fracos é o ambiente negativo entre empresas provocado por vários problemas que foram se acumulando. Um deles, a situação crítica do setor elétrico:
— Com o perdão da expressão, mas o setor elétrico está em estado de choque. Descapitalizado, sem horizonte para investir e sem saber quando a situação se normaliza após a intervenção do ano passado. A Petrobras também está descapitalizada. Esses são dois pesos importantes para a economia. Nós estamos acumulando problemas em várias áreas — disse.
Desse tipo de questão se fala em virada de ano, para que seja corrigida. Há o que fazer para aumentar o ânimo desses empresários que estão pondo investimentos na gaveta. Mendonça de Barros disse que as concessões licitadas, mesmo sendo feitas “no apagar das luzes”, destravou um pouco o investimento.
O ano de 2014 é eleitoral e normalmente o governo aumenta o gasto para tentar produzir um clima de mais otimismo. Se isso acontecer, terá o efeito inverso: de piorar as expectativas dos empresários já preocupados com a questão fiscal. Atualmente, esse tema assusta até os economistas que costumavam defender a política econômica.
O temor do governo é de que haja um rebaixamento da nota do Brasil em 2014. Economistas que ouvi acham que, por ser um ano eleitoral, as agências vão preferir adiar. Elas já alertaram. Não vão querer provocar maiores tremores no ano que vem.
Mas se o quadro fiscal continuar se deteriorando, na visão de Mendonça de Barros, o ano de 2015 também será difícil. O país estaria então completando o quinto ano de baixo crescimento e sob o risco de rebaixamento da nota. Por isso, o melhor seria começar a ajustar as contas já no ano que vem, mesmo sendo um ano eleitoral. O maior dos riscos, no entanto, é continuar esse desânimo entre os empresários, detectado por Mendonça de Barros.
http://www.brasil247.com/pt/247/economia/125105/247-adverte-aposta-no-pessimismo-%C3%A9-eleitoral.htm
BUCCI: MÍDIA BRASILEIRA NÃO FORMA O PIG
Ex-presidente da Radiobrás no governo Lula, Eugênio Bucci refuta a tese de que a imprensa brasileira forme um partido de oposição e golpista; "Nossa imprensa, convenhamos, é preponderantemente de direita e, muitas vezes, apresenta falhas de caráter, algumas inomináveis, mas nunca se perfilou com a organicidade de um partido político", diz ele
26 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 11:16
247 - Na visão de Eugênio Bucci, ex-presidente da Radiobrás no governo Lula, o chamado PIG, Partido da Imprensa Golpista, não existe. Leia, abaixo, sua análise:
Primeiro, eles acusavam a imprensa de ser um "partido de oposição" e pouca gente se incomodou. A acusação era tão absurda que não poderia colar. Numa sociedade democrática, relativamente estável e minimamente livre, os jornais vão bem quando são capazes de fiscalizar, vigiar e criticar o poder. O protocolo é esse. A normalidade é essa. Logo, o bom jornalismo pende mais para a oposição do que para a situação; a imprensa que se recusa a ser vista como situacionista nunca deveria ser atacada. Enfrentar e tentar desmontar a retórica do poder, irritando as autoridades, é um mérito jornalístico. Sendo assim, quando eles, que se julgavam aguerridos defensores do governo Lula, brandiam a tese de que a imprensa era um "partido de oposição", parecia simplesmente que os jornalistas estavam cumprindo o seu dever - e que os apoiadores do poder estavam simplesmente passando recibo. Não havia com o que se preocupar.
Depois, as autoridades subiram o tom. Falavam com agressividade, com rancor. A expressão "partido de oposição" virou um xingamento. Outra vez, quase ninguém de fora da base de apoio ao governo levou a sério. Afinal, os jornais, as revistas e as emissoras de rádio e televisão não se articulavam nos moldes de um partido: não seguiam um comando centralizado, não se submetiam a uma disciplina tipicamente partidária, não tinham renunciado à função de informar para abraçar o proselitismo panfletário. Portanto, acreditava-se, o xingamento podia ser renitente, mas continuava sendo absurdo.
Se os meios de comunicação tivessem passado a operar como partido unificado, com o intento de sabotar a administração pública, o que nós teríamos no Brasil seria um abalo semelhante ao que se viu na Venezuela em 2002. Ali, houve um conluio escandalosamente golpista dos meios de comunicação que, por meio de informações falsificadas, tentou derrubar o presidente Hugo Chávez, eleito democraticamente havia pouco tempo. Por fortuna, a quartelada mediática malogrou ridiculamente. Por escassez de virtú, Chávez passaria todo(s) o(s) seu(s) governo(s) se vingando das emissoras que atentaram contra ele.
No Brasil, não tivemos nada parecido. Nossa imprensa, convenhamos, é preponderantemente de direita e, muitas vezes, apresenta falhas de caráter, algumas inomináveis, mas nunca se perfilou com a organicidade de um partido político. Por todos os motivos, a acusação continuava sem pé nem cabeça.
Mas o fato é que começou a colar e o cenário começou a ficar esquisito. Agora, as inspirações até então submersas daquela campanha anti-imprensa afloram com mais nitidez. Era um recurso para dar tônus à disposição dos cabos eleitorais (de muitos níveis), para inflar o ânimo dos militantes de baixo e para inflar o ego dos militantes de cima. Agora, chegamos ao ponto de dizerem que os repórteres deram de ombros para a cocaína encontrada no helicóptero da família do senador Zezé Perrella (PDT-MG) porque ele, embora esteja filiado a um partido da base governista, teria lá suas inclinações consideradas pouco fiéis. Difícil saber. As mesmas vozes acusam os mesmos repórteres de terem exagerado na cobertura do julgamento do mensalão. Na falta de uma oposição de verdade que pudesse servir de vilã cruel, na falta de um satanás mais ameaçador para odiar (a "herança maldita" de FHC não funciona mais como antagonista imaginária), querem fazer valer essa ficção ufanista de que o País vai às mil maravilhas, só o que atrapalha a felicidade geral é esse maldito partidarismo da imprensa. A tese pode ser doidona, mas está funcionando. Alguns quase festejam: "Viva! Achamos um inimigo para combater! Vamos derrotar os editores de política deste país!".
Deu-se, então, um fenômeno estranhíssimo: as forças instaladas no governo, como que enfadadas do ofício de governar, começaram a fazer oposição à imprensa. Dilma Rousseff jamais embarcou na cantilena, o que deve ser reconhecido e elogiado, mas está cercada de profetas que veem em cada redator, em cada fotojornalista, uma ameaça ao equilíbrio institucional.
A oratória petista depende de ter um antagonista imaginário. Sem isso, parece que não para mais de pé. Sim, temos aí um traço de discurso autoritário. Em todo regime autoritário ou totalitário, a figura mais essencial é a do inimigo. Para os nazistas, esse inimigo estruturante foram os judeus. Para o chavismo, foi o imperialismo, encarnado por Bush, que teria cheiro de enxofre. E mesmo Bush só conseguiu salvar seu mandato do fiasco porque lhe caiu no colo o inimigo chamado terrorismo. É claro que não se pode dizer que o PT atualmente se reduza a um discurso tropegamente autoritário, mas as feições autoritárias e fanatizantes desse discurso vão ganhando densidade a cada dia. Não obstante, está assentado em bases fictícias, completamente fictícias.
Vale frisar este ponto: sem um inimigo para chamar de seu, esse tipo de ossatura ideológica se liquefaz. O que seria dos punhos cerrados dando soquinhos no ar sem o auxílio luxuoso do inimigo imaginário? O que seria dos sonhos de martírio em nome da causa? O que seria das fantasias heroicas e do projeto ambicioso de virar estátua de bronze em praça pública?
Foi aí que a imprensa entrou no credo. Na falta de outra instituição disposta a não se dobrar ao poder, disposta a desconstruir os cenários grandiloquentes armados pelas autoridades, eles encontraram na imprensa a sua razão de viver e de guerrear. Só assim, só com seu inimigo imaginário bem definido, esse discurso encontra seu ponto de equilíbrio: ficar no poder e ao mesmo tempo acreditar - e fazer acreditar - que está na oposição, que combate um mal maior. Seus adeptos, que imaginam odiar a imprensa sem se dar conta de que a temem, agarram-se à luta com sofreguidão. Estão em ponto de bala para o ano eleitoral de 2014.
Depois, as autoridades subiram o tom. Falavam com agressividade, com rancor. A expressão "partido de oposição" virou um xingamento. Outra vez, quase ninguém de fora da base de apoio ao governo levou a sério. Afinal, os jornais, as revistas e as emissoras de rádio e televisão não se articulavam nos moldes de um partido: não seguiam um comando centralizado, não se submetiam a uma disciplina tipicamente partidária, não tinham renunciado à função de informar para abraçar o proselitismo panfletário. Portanto, acreditava-se, o xingamento podia ser renitente, mas continuava sendo absurdo.
Se os meios de comunicação tivessem passado a operar como partido unificado, com o intento de sabotar a administração pública, o que nós teríamos no Brasil seria um abalo semelhante ao que se viu na Venezuela em 2002. Ali, houve um conluio escandalosamente golpista dos meios de comunicação que, por meio de informações falsificadas, tentou derrubar o presidente Hugo Chávez, eleito democraticamente havia pouco tempo. Por fortuna, a quartelada mediática malogrou ridiculamente. Por escassez de virtú, Chávez passaria todo(s) o(s) seu(s) governo(s) se vingando das emissoras que atentaram contra ele.
No Brasil, não tivemos nada parecido. Nossa imprensa, convenhamos, é preponderantemente de direita e, muitas vezes, apresenta falhas de caráter, algumas inomináveis, mas nunca se perfilou com a organicidade de um partido político. Por todos os motivos, a acusação continuava sem pé nem cabeça.
Mas o fato é que começou a colar e o cenário começou a ficar esquisito. Agora, as inspirações até então submersas daquela campanha anti-imprensa afloram com mais nitidez. Era um recurso para dar tônus à disposição dos cabos eleitorais (de muitos níveis), para inflar o ânimo dos militantes de baixo e para inflar o ego dos militantes de cima. Agora, chegamos ao ponto de dizerem que os repórteres deram de ombros para a cocaína encontrada no helicóptero da família do senador Zezé Perrella (PDT-MG) porque ele, embora esteja filiado a um partido da base governista, teria lá suas inclinações consideradas pouco fiéis. Difícil saber. As mesmas vozes acusam os mesmos repórteres de terem exagerado na cobertura do julgamento do mensalão. Na falta de uma oposição de verdade que pudesse servir de vilã cruel, na falta de um satanás mais ameaçador para odiar (a "herança maldita" de FHC não funciona mais como antagonista imaginária), querem fazer valer essa ficção ufanista de que o País vai às mil maravilhas, só o que atrapalha a felicidade geral é esse maldito partidarismo da imprensa. A tese pode ser doidona, mas está funcionando. Alguns quase festejam: "Viva! Achamos um inimigo para combater! Vamos derrotar os editores de política deste país!".
Deu-se, então, um fenômeno estranhíssimo: as forças instaladas no governo, como que enfadadas do ofício de governar, começaram a fazer oposição à imprensa. Dilma Rousseff jamais embarcou na cantilena, o que deve ser reconhecido e elogiado, mas está cercada de profetas que veem em cada redator, em cada fotojornalista, uma ameaça ao equilíbrio institucional.
A oratória petista depende de ter um antagonista imaginário. Sem isso, parece que não para mais de pé. Sim, temos aí um traço de discurso autoritário. Em todo regime autoritário ou totalitário, a figura mais essencial é a do inimigo. Para os nazistas, esse inimigo estruturante foram os judeus. Para o chavismo, foi o imperialismo, encarnado por Bush, que teria cheiro de enxofre. E mesmo Bush só conseguiu salvar seu mandato do fiasco porque lhe caiu no colo o inimigo chamado terrorismo. É claro que não se pode dizer que o PT atualmente se reduza a um discurso tropegamente autoritário, mas as feições autoritárias e fanatizantes desse discurso vão ganhando densidade a cada dia. Não obstante, está assentado em bases fictícias, completamente fictícias.
Vale frisar este ponto: sem um inimigo para chamar de seu, esse tipo de ossatura ideológica se liquefaz. O que seria dos punhos cerrados dando soquinhos no ar sem o auxílio luxuoso do inimigo imaginário? O que seria dos sonhos de martírio em nome da causa? O que seria das fantasias heroicas e do projeto ambicioso de virar estátua de bronze em praça pública?
Foi aí que a imprensa entrou no credo. Na falta de outra instituição disposta a não se dobrar ao poder, disposta a desconstruir os cenários grandiloquentes armados pelas autoridades, eles encontraram na imprensa a sua razão de viver e de guerrear. Só assim, só com seu inimigo imaginário bem definido, esse discurso encontra seu ponto de equilíbrio: ficar no poder e ao mesmo tempo acreditar - e fazer acreditar - que está na oposição, que combate um mal maior. Seus adeptos, que imaginam odiar a imprensa sem se dar conta de que a temem, agarram-se à luta com sofreguidão. Estão em ponto de bala para o ano eleitoral de 2014.
ZERO HORA TAMBÉM PEDE BRASIL NAS RUAS
Jornal do grupo RBS, comandado por Nelson Pacheco Sirotsky, diz que, desde as manifestações de junho, “o Congresso preocupou-se em impor mais rigor a crimes envolvendo corrupção, tornou suas votações mais transparentes em alguns casos, facilitando o acompanhamento por parte dos cidadão; continua, porém, devendo uma reforma política ampla”
26 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 08:38
247 – O jornal Zero Hora, do grupo RBS, de Nelson Sirotsky, também chama brasileiros às ruas. Em editorial desta quinta-feira, publicação cita avanços pós-manifestações de junho, mas diz que há muito ainda a ser feito. Leia:
O Brasil nas ruas
Quem nos representa no Brasil, sejamos nós jovens ou nem tanto, crianças ou idosos? Desde junho último, quando brasileiros começaram a ocupar as ruas, contagiados pela força da juventude, ficou claro que não são mais os políticos tradicionais, ou pelo menos não apenas eles, nem outros clássicos porta-vozes. Mobilizados basicamente pelas redes sociais, com hashtags como #VemPraRua, #OGiganteAcordou e #MudaBrasil, os manifestantes recorreram a contrastantes pedaços de cartolina, rabiscados à mão, para alardear essas mensagens relevantes. “Tem tanta coisa errada que não cabe em um cartaz”, resumia um dos pôsteres. Por trás da máscara do personagem Guy Fawkes, de V de Vingança, porém, entre as boas intenções dos manifestantes de maneira geral e excessos de grupos como os black blocs, o recado foi dado. O país pode não ter despertado de vez, nem ter se transformado como sonhavam os ativistas, mas já não é o mesmo.
Motivados inicialmente pelo alto custo e a baixa qualidade do transporte público, os protestos deixaram grafados desde o início: “Não é por 20 centavos, é pelo meu futuro”. Em seguida, miraram os investimentos da Copa, com a ressalva: “Não é contra a Seleção, é contra a corrupção”. Em outras mensagens escritas, os manifestantes passaram a exigir “Saúde padrão Fifa”, a ironizar que “Ia ixcrever augu legau mais faltô edukssão”, a pedir segurança com frases do tipo “Por favor, não me bata! Proteja-me”, a alertar a classe política de que “Ou para a roubalheira, ou paramos o Brasil”. Diante de apelos transcritos também em pôsteres com referências a clássicos da música brasileira como “Brasil, mostra tua cara” e “O dia vai raiar, sem lhe pedir licença”, dirigentes brasileiros dispuseram-se finalmente a ouvir mais a voz das ruas, a discursar e a ostentar menos, a mudar a agenda, a fazer diferente, a reconhecer erros.
Em muitas capitais, a tarifa de ônibus urbano diminuiu, mas a discussão não se limitou aos 20 centavos: hoje, a mobilidade urbana é tema central, o espaço público entrou na pauta da sociedade e a bicicleta se firma como símbolo da mudança. O Planalto se deu conta da gravidade do estado da saúde pública. Mas, por enquanto, as mudanças são percebidas mais por meio de iniciativas polêmicas, como o Mais Médicos, enquanto persiste o medo nas ruas e os professores continuam longe de ter “o salário de um deputado e o prestígio de um jogador de futebol”. O Congresso preocupou-se em impor mais rigor a crimes envolvendo corrupção, tornou suas votações mais transparentes em alguns casos, facilitando o acompanhamento por parte dos cidadãos. Continua, porém, devendo uma reforma política ampla. Ampla o suficiente para levar os eleitores a recuperar a confiança perdida em seus representantes escolhidos pelo voto.
A exemplo de outros movimentos disseminados pelo mesmo processo de “propagação viral” como a Primavera Árabe, o Occupy Wall Street e os Indignados, na Espanha, o nosso não conseguiu tornar reais todos os desejos manifestados nos cartazes. Depois de junho de 2013, porém, o relacionamento entre instituições públicas e privadas com seus públicos, nelas incluídas a própria mídia, nunca mais será o mesmo. O legado das manifestações populares terá mais consistência se contribuir para reforçar a cidadania e a ética entre os brasileiros.