DILMA FECHA SEU BALANÇO DA COPA COM MÍDIA GLOBAL
Na antevéspera de receber 15 chefes de Estado no jogo final da Copa do Mundo, no domingo, no Maracanã, e perto de iniciar uma reunião decisiva dos Brics, na próxima terça-feira, em Fortaleza, presidente Dilma Rousseff faz ofensiva na mídia global; ela concede entrevista a correspondentes estrangeiros no Palácio do Planalto após ter falado à rede americana CNN; em pauta, balanço da Copa do Mundo que encantou estrangeiros e formação do banco dos Brics, que será alternativa ao FMI; Dilma não quer deixar espaços vazios até a eleição de outubro
11 DE JULHO DE 2014 ÀS 11:37
247 – A presidente Dilma Rousseff está fazendo exatamente o mesmo que aconselhou, pelo Twitter, à Seleção Brasileira quando registrou 'levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima', logo após a derrota por 7 a 1 para a Alemanha. Sem deixar espaço para o vácuo de posicionamento, Dilma já fez seu balanço da Copa para a âncora da rede CNN, Christiane Amanpour, concedeu entrevista exclusiva à nacional Globo News e, nesta sexta-feira 11, recebe, no fim da tarde, um grupo de correspondentes no Brasil dos principais veículos de comunicação do mundo. A mensagem de Dilma é a de que País passou no teste de organização do Mundial, apesar da derrota esportiva.
A estratégia de atender a mídia estrangeira faz sentido. Afinal, mesmo após o encerramento da Copa o mundo continuará de olho no Brasil. A partida final, no domingo, no Maracanã, será assistida por 15 chefes de Estado. Na terça-feira, em Fortaleza, o País recebe uma das mais importantes reuniões dos Brics – o grupo de países formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – dos últimos tempos. Será o momento, depois de muitas confabulações, da criação dos banco dos Brics. Esse organismo é uma resposta dos países emergentes ao Fundo Monetário Internacional, controlado pelo grupo de países ricos. O novo organismo de fomento deve nascer com um caixa de cerca de US$ 100 bilhões e atuará no fomento de obras de infraestrutura dos países-membros.
Após a reunião dos Brics, o presidente da China, Hu Jintao, ficará por mais dois dias no Brasil, em visita oficial. O país é, hoje, um dos maiores parceiros comerciais do país.
Em seu balanço da Copa, Dilma disse à âncora Christiane Amanpour, da rede CNN, que o Mundial "transcorreu em paz, com muita alegria e toda a infraestrutura funcionando". A mensagem deverá ser repetida hoje aos correspondentes estrangeiros. A presidente tem pregado mudanças no futebol brasileiro, mas não lembra que o esporte "não é uma guerra, é um jogo". A preocupação de Dilma está em minimizar os eventuais efeitos eleitorais da derrota da vexaminosa derrota da Seleção Brasileira para a da Alemanha. Para a presidente, o povo saberá separar as coisas.
MARADONA ELOGIA MUNDIAL: “BRASIL GANHOU COMO PAÍS”
Celebridade mais controvertida do planeta, adorado e odiado, Diego Maradona marca mais um gol ao fazer análise resumida, mas profunda sobre a Copa do Mundo no Brasil; "Parecia que teríamos de comprar uma arma ao desembarcar por aqui", disse o ex-jogador que os argentinos cantam como "melhor que Pelé"; em seu programa De Zurda (de esquerda) na Telesur, da Venezuela, ídolo fez referência à campanha de descrédito enfrentada pelo País antes da competição; "O que se pintava lá fora é que seria um caos", definiu ele; Pelé, por seu lado, ainda não falou; ele saiu da cena da Copa desde a terça-feira 8; pouco antes da derrota da Seleção por 7 a 1 frente a Alemanha, seu filho Edinho foi preso, em Santos, condenado a 33 anos de prisão; Devastado, rei terá de ser forte
11 DE JULHO DE 2014 ÀS 13:30
247 – Celebridade esportiva mais controvertida do mundo, sem rivais nas escolhas políticas, dramas pessoais e capacidade de criar casos, o ex-jogador Diego Maradona é o torcedor número 1 da Argentina no Brasil. Ele está saboreando a ida da seleção de seu país, após 24 anos, a uma final de Copa do Mundo, além de estar se divertindo com a derrota da Seleção Brasileira, por 7 a 1, frente a da Alemanha. Estaria, em tese, numa situação para tripudiar do Brasil, mas sua opinião sobre o Mundial no País é bem diferente:
- O Brasil perdeu em campo, mas ganhou como país, resumiu ele, na quinta-feira 10, no programa De Zurda (de esquerda), que faz para a emissora Telesur, da Venezuela.
Maradona indicou que a campanha de descrédito da capacidade de o Brasil organizar o Mundial, iniciada internamente, nas páginas da mídia tradicional, o deixou assustado, assim como a outros turistas:
- O que se pintava é que seria um caos. Parecia que teríamos de comprar uma arma ao desembarcar por aqui, comparou. "Mas não foi nada disso".
O ex-jogador circulou por diferentes cidades, sendo visto em jogos da Seleção da Argentina e de outras equipes. Ele não deixou de ser vaiado, algumas vezes, pelo público, em ofensas que faziam referência à sua dependência química, enfrentada com um forte tratamento em Cuba. Por outro lado, foi saudado pelo cânticos de "Maradona é melhor que Pelé" entoados por milhares de argentinos que tomaram o País para acompanhar sua Seleção. Certamente a maior torcida estrangeira presente na Copa, os argentinos realizaram uma 'invasão' alegre e pacífica, premiada com a disputa da final da Copa.
Pelé, por outro lado, saiu da cena da Copa desde a terça-feira 8. Aquele deve ter sido talvez o dia mais triste da vida do "rei do futebol". Naquela manhã, Edinho, seu filho, foi preso, em Santos, condenado a 33 anos de reclusão por lavagem de dinheiro e associação ao tráfico de drogas. À tarde, a equipe nacional sofreu a maior derrota de toda a sua história. O rei vinha acompanhando pessoalmente todos os jogos do Brasil no Mundial, mas agora está recolhido. Ele precisará ser forte para superar a tragédia familiar.
MINO CARTA: PROBLEMA DA COPA FICOU NOS GRAMADOS
Segundo diretor de redação da Carta Capital, Mino Carta, ao contrário do que pretendiam a mídia e a oposição, a Copa do Mundo provou que os maiores problemas do Brasil ficam no gramado: “Este campeonato mundial exibiu um país bem diferente daquele anunciado. A assistência global viu uma boa organização em um recanto civilizado, deste ângulo digno da melhor contemporaneidade, na contramão das circunstâncias previstas alhures e, mais ainda, por aqui”
11 DE JULHO DE 2014 ÀS 09:00
por Mino Carta
Uma criança que chora por culpa do pai dá pena. Com o pai, como haveria de ser, não aprendeu que o futebol é apenas um jogo e que a pátria não calça chuteiras, além de ser o derradeiro refúgio dos covardes, conforme o doutor Johnson. Pela lição paterna, deveria entender a justa dimensão do ludopédio, e hierarquizar a sua importância na relação com outras questões propostas pela vida, embora esteja longe de ser pecado perceber graça e arte no trato da bola.
Há situações que não se dão por ocaso. As crianças choram na arquibancada, mas a nação em peso habilita-se à puerilidade. Sou de um tempo em que Pedro Luís Paoliello e Mario Moraes formavam, desde o imediato Pós-Guerra até meados dos anos 60, a mais ouvida e celebrada dupla radiofônica das transmissões futebolísticas. Pedro Luís, locutor insuperável, conheci, já sessentão, cavalheiro impecável. Moraes, comentarista de voz pastosa, pensador do esporte bretão, não conheci. Lembro ambos, com saudade.
Ao cabo da partida, Moraes analisava os jogadores por duas lentes: tecnicamente e taticamente. Hoje a ele perguntaria, meu comentarista preferido, sucinto e certeiro nas apreciações, que diria a respeito do desempenho da Seleção Canarinho na fatídica semifinal de 8 de julho de 2014, contra o time teutônico. Muito teutônico, ao som de Wagner, a bem da verdade factual. Ouço-o sentenciar: tecnicamente abaixo de medíocre, taticamente um desastre. Deste específico ponto de vista, me seduz enxergar nos jogadores a criança mal ensinada pelo pai. E penso em Felipe Scolari, a encarar a tragédia entre atônito e perplexo.
Haverá quem evoque, a favor dele, Scolari campeão em 2002. Pois naquela seleção os craques autênticos sobravam, e o time jogou como sabia, a dispensar técnicos. O mesmo aconteceu em 1958, quando os jogadores impuseram a Vicente Feola a escalação e inventaram por conta própria um esquema, o 4-3-3 que poderia tornar-se 4-2-4, destinado a revolucionar o futebol mundial. O qual, nos últimos 56 anos, mudou muito. Mudou demais.
Dinheiro em proporções exorbitantes adentrou o gramado e uma quadrilha passou a comandar a Fifa, instruída a contento por um brasileiro, João Havelange. Jules Rimet, aquele frágil senhor que entregou a taça em 1950, tadim, não tinha a mais remota possibilidade de imaginar seu atual sucessor, Joseph Blatter. Totò Riina não se sairia melhor do que Blatter. Só que Riina está na cadeia.
Sobe à memória, do longínquo passado, uma foto de Djalma Santos, campeão em 58 e 62, a carregar as chuteiras embrulhadas em papel jornal, e logo sobrevém de chofre a imagem de David Luiz em lágrimas ao sair de campo. No microfone que prorrompe debaixo de sua boca trêmula, soluça: “Eu queria apenas a felicidade do meu povo, a alegria de todos”. Mario Moraes afirmaria dele: tecnicamente razoável, taticamente nota zero. E no mais, que dizer do zagueiro recém-adquirido pelo PSG por 50 milhões de libras: hipócrita ou parvo? Ou reuniria em um único ser humano as duas características?
Moraes e Pedro Luís não se permitiam concessões e aí está outra comparação: raríssimos, ao longo desta Copa, os comentários sensatos. Em contrapartida, a enchente impetuosa das informações dispensáveis a tomar inexoravelmente todos os espaços disponíveis, como se nada mais houvesse a ser noticiado além do festival da bola, e os comentários amiúde equivocados, como se o objetivo fosse levar a plateia a acreditar no impossível e a estimular-lhe a imbecilização. A campanha da Seleção foi pífia e a semifinal imerecida. Em dois jogos, contra Croácia e Colômbia, os canarinhos gozaram da colaboração decisiva dos juízes. No jogo contra o Chile, os fados haviam acordado de excelente humor. O outro encontro foi o empate com o México. Neymar mostrou seus limites de criança mimada. Esporádicas as avaliações isentas, responsáveis, de sorte a preparar a plateia para o desenlace melancólico.
Enredado pelas recordações, enveredei por reflexões pretensamente técnicas. Cabem outras mais significativas, e são políticas, e também sociológicas, se quiserem, sem a mais pálida intenção de escrever um tratado. A Copa teve o condão de deixar claro que o problema do Brasil não estava fora dos estádios, e sim no próprio gramado. Este Campeonato Mundial exibiu um país bem diferente daquele anunciado. A assistência global viu uma boa organização em um recanto civilizado, deste ângulo digno da melhor contemporaneidade, na contramão das circunstâncias previstas alhures e, mais ainda, por aqui.
A quem aproveita? Ao País. A todos nós. Não falta, entretanto, quem queira tirar vantagem no bem e no mal. Ouvimos nos últimos meses contraditórias versões a respeito de quem se valeria da situação para favorecer seus interesses, proclamadas em ambientes diversos e sustentadas pela mídia nativa. A Copa sela o enterro de Dilma. Nada disso, Dilma pretende usar a Copa em seu benefício. Perdão, perdão, boi na linha: o desfecho da Copa trabalha contra Dilma. Há mesmo alguns, desvairados, a afirmar que a derrota, acachapante, diria Mario Moraes, sofrida contra a Alemanha, é culpa da Dilma.
CartaCapital esforçou-se para sustentar, amparada nas aulas que a história costuma ministrar aos menos desavisados, que resultados futebolísticos e eleitorais seguem por caminhos próprios e não se cruzam. Mesmo assim, preparemos nossos corações para assistir a mais uma quermesse de sandices a respeito. Registre-se que, de fato, o Brasil oferece uma prova de sua contingente decadência futebolística e outra, muito mais importante, de um inesperado grau de maturidade, embora misturado com a puerilidade nacional quando trila o apito.
CRETINOS AGARRAM-SE À DERROTA COMO VIRA-LATAS DEFENDEM SEUS OSSOS
CARLOS ODAS
O que vale analisar é a premissa mais visível em todas as teses lançadas pelo cretinismo: para derrotar Dilma e pôr Aécio Neves no Planalto é preciso fazer o brasileiro sentir-se mal consigo mesmo
Como esperado, desde aquele fatídico 4 de julho nossos insuperáveis cretinos lambem a derrota da Seleção brasileira contra a Alemanha, saboreiam-na aos bocados, olham-na com olhos lânguidos por medo de que perca o sabor que, para eles, é o de uma iguaria; esperavam, já um tanto ansiosos, uma tragédia com a qual pudessem marcar sua narrativa desta Copa do Mundo, quiçá deste "período histórico". Nesse afã, não pouparam sequer a dor de famílias no caso da queda do viaduto em Belo Horizonte; sordidamente, tentaram ligar à Copa – apenas para culpar o Governo Federal – uma responsabilidade que, afinal, era da Prefeitura daquela cidade, ocupada por um aliado dos cretinos, como executora da obra. Agarram-se à derrota como um vira-latas a defender seu único osso; o fazem para disfarçar o sabor do próprio e cotidiano fracasso diante do fato que a derrota em campo não nos define, mas a competência fora dele, sim, e muito mais.
Segundo dez entre dez cretinos fundamentais da mídia familiar – "familiar" não só pela propriedade dos veículos (e dos cretinos que as servem), mas porque posta a serviço dos interesses políticos e financeiros das famílias suas proprietárias –, dançávamos diante do abismo de nossa incompetência quando, dois anos antes, toda a infraestrutura que daria suporte à realização da Copa do Mundo não estava pronta – onde já se viu? Sabemos onde se viu; na Alemanha e na África do Sul, antes das suas respectivas edições da Copa, na Inglaterra antes das Olimpíadas de 2012. Mas a indignação seletiva dos nossos insuperáveis cretinos não teria o impacto projetado se não viesse carregada de tons dramáticos: estávamos prestes a dar, diante do mundo, um vexame histórico jamais protagonizado por outra nação do planeta. Era mentira. Era torcida. Era a eterna tentativa de definir o povo brasileiro como uma gente derrotada e sem virtudes reais, a não ser o tão propalado quanto falso "jeitinho brasileiro".
Eis que provamos o contrário do que queriam demonstrar os cretinos: não somos os vira-latas do mundo. Apostaram no fracasso da Copa e no sucesso da Seleção; ao verem as primeiras expectativas frustradas, recearam que um hexacampeonato mundial em terras brasileiras, e num ambiente de festa nacional, sufocasse de vez uma oposição partidária que já não vive sem os préstimos da cretinice engajada que exercem. Produziram daí as peças mais infames de que foram capazes; um escreveu à matilha de trolls que alimenta diariamente com suas doses de ódio coisas como "a oposição nunca disse que a Copa seria um caos" e "todos sabíamos que o evento seria um sucesso" ou, ainda, "o sucesso da realização da Copa não tem nada a ver com a organização do evento". Mentira, mentira e mentira. Bem paga, o que não lhe aproxima nem um pouco da verdade. Outro, empedernido, alertava para que a oposição não permitisse que Dilma e o PT se "apropriassem do sucesso da Copa do Mundo durante a campanha eleitoral".
Ao verem, mais adiante, a inversão completa de suas expectativas (sucesso fora de campo e desastre dentro das quatro linhas), os magos – sim, a maioria dos cretinos supõem-se magos – passaram a outra tese: o sucesso da Copa não pode ser apropriado por Dilma, mas o fracasso da Seleção brasileira deve ser associado a ela. E aí o cinismo regiamente pago excedeu-se. Por um lado, o que há de novo é o claro abandono das tentativas de escamotear suas relações; sabem que já não podem mais esconder que trabalham, primeiro, contra uma candidatura e, depois, em favor de outra. Resta a tentativa de ocultar a agenda que defendem enquanto podem. Afinal, seu trabalho não seria tão difícil se pudessem dizer abertamente o que desejam para o país. Não podem, pois significa, no médio prazo, o retrocesso na condição de vida de milhões de brasileiros.
O que vale analisar, no entanto, é a premissa mais visível em todas as teses lançadas pelo cretinismo: para derrotar Dilma e pôr Aécio Neves no Planalto é preciso fazer o brasileiro sentir-se mal consigo mesmo; é preciso difundir e cultivar a "malaise", como gosta de referir-se FHC. Ou seja, é preciso minar esperanças, é preciso baixar a autoestima do brasileiro e fazê-lo voltar, o quanto antes, a sentir-se um vira-latas. Assim, a derrota serve-lhes como o manto perfeito. Aliás, tanto melhor, nesse caso, que não tenha sido uma derrota simples, mas algo que se possa chamar de "histórico".
A Copa do Mundo do Brasil está sendo, sim, a Copa das Copas, mas não é por isso que eu, por exemplo, votarei em Dilma; é pela agenda que ela representa de ampliação de direitos e de participação popular, de redistribuição de renda e, sobretudo, de desenvolvimento soberano do país. Ao contrário de Aécio. Se a Bovespa cai quando Dilma sobe, é um sinal de que quem ganha mais com a concentração de renda que com a redistribuição dela prefere Aécio. Simples. A outra cantilena que já cansou aos ouvidos é a de que o Estado brasileiro é um mastodonte comedor do "nosso dinheiro". Mentira também. Nosso estado é oneroso, sim, porque as iniquidades legadas historicamente a sucessivas gerações de brasileiros são imensas. É contra isso que temos de lutar, contra as iniquidades; o tamanho do estado deve corresponder ao enfrentamento desse desafio, já que também é mentira – como já demonstrado – que o mercado esteja aí para substituir o estado no enfrentamento das desigualdades distribuindo capital em troca de força de trabalho. Não tem nada a ver com o surrado espantalho da comunização; os cretinos, aliás, nunca foram contra a intervenção estatal, na economia inclusive, mas disputam o vetor, o sentido, dessa intervenção – se for para sustentar os de cima, tudo bem para eles.
Então essa historinha de que "o SUS não presta", "bancos públicos devem ser privatizados" e "estatais são cabides de emprego" deve ser combatida no dia-a-dia da campanha eleitoral e em todos os outros dias em que seja necessário fazê-lo. Uma profunda reforma do Estado é bem vinda, desejável e necessária. Para ajustes e para a construção de uma sociedade mais justa, e não para redução de seu papel no combate às iniquidades. A síntese que me agrada, no caso brasileiro, é: mais estado, sim, onde ele é essencial, mas com cada vez menos poder estatal e mais poder popular. Os cretinos chamam isso de "sovietização", o que é uma burrice. Expressam apenas os velhos medos da Casa Grande.
Para que voltem ao poder, portanto, precisam que as esperanças do povo brasileiro sejam derrotadas; precisam de uma juventude apática à política. Não lhes incomoda a criminalização da política, aliás, pois preferem-na como exercício de poucos, de "profissionais" e "raposas". Nesse sentido, o simpático tome da Alemanha lhes deu fôlego e um discurso. A derrota, no entanto, não define o povo brasileiro nem o que foi essa Copa do Mundo
A realidade, afinal, tem sido há tempos a implacável Alemanha carrasca para os cretinos.
7×1 É ‘VERGONHA’ – SERÁ?
JEAN MENEZES DE AGUIAR
A seleção perdeu feio. Assistir 5 gols em menos de meia hora foi surreal. Chegar a um placar negativo de 7 é estarrecedor. Mas não se pode querer que o time nem o povo se sintam humilhados
A cobrança sobre a seleção brasileira pela imprensa e grande parte do público acerca do resultado terrível de 7 a 1 para Alemanha tem agregado um fator que desafia atenção: a ‘vergonha’. Até esta semana não havia qualquer vergonha, humilhação ou infâmia, como se passou a ouvir de uma hora para outra após o 7 a 1. Assim, uma única derrota, ainda que estrondosa, pode gerar ‘vergonha’?
Tudo bem que não é uma derrota qualquer, não mesmo. É um recorde negativo em vários aspectos. Mas continua sendo uma única derrota. Quando muitos não querem aceitar a derrota como um ‘acidente’ de percurso, entra em cena a intolerância. E um sensacionalismo da grande mídia, claro. A derrota, mesmo um 7 a 1 pertence a qualquer disputa. Tanto pertence que existiu.
O problema parece estar em não se querer aceitar que a seleção ‘pudesse’ perder. Não se quis dar este direito a ela. Esquece-se o principal, que aquilo é um jogo e o melhor vencerá. Simples assim? Sim, simples assim. E assim foi. Para reforçar, não se pode esquecer que o time estava sem o craque maior e seu capitão titular.
Artur Xexeo no artigo ‘A culpa é do psicológico’ deitou e rolou na dependência que Felipão tem com esta coisa ‘psi’. Algo mais para malandras palestras motivacionais do que treinamento sério, tático e intensivo. Tudo era ‘chama a psicóloga’, como zombou corretamente Xexeo.
Quando o jornalista ou mesmo o torcedor insere na análise a intolerância para carimbar a derrota como ‘vergonha’ ou ‘infâmia’ há um comprometimento sério na leitura. Fica patente um consumismo mimado de que só vitória interessa, não a disputa. O fim da ideia de que ‘competir é o que importa’, para a ideia substituta de que ‘vencer é a única opção’ vem gerando essa horda de mimados fanáticos. São homenzarrões que abrem o berreiro nos estádios e, por exemplo, agridem ou largam a esposa quando o time perde um campeonato. Isso quando não matam o torcedor rival.
É ‘vergonhoso’ perder em uma competição? Quer dizer, disputar e perder? Há aí indagações interessantes. Perder de 1 e ser desclassificado ‘pode’. Mas perder de 7 e ser identicamente desclassificado fez inserir este outro sentimento, a ‘vergonha’. Alguns dizem ‘humilhação’.
Quando muitos falam em vergonha exercem uma ‘cobrança’. Põem o dedo na cara do outro. Pensam como credores de um comportamento alheio, de um resultado. Como se a expectativa de vitória desse a eles um crédito e ao jogador uma obrigação. Daqui a pouco terá torcedor querendo cobrar dano moral na justiça porque seu time perdeu.
Essa cobrança do comportamento é uma forma de consumismo que dá vazão a uma forma de vingança pessoal. Assim, não foi o agente cobrador que perdeu, mas o outro, afinal ele insere vergonha na conduta do outro, não na dele própria.
Tudo isso é um manejo consumista do desejo, do sonho. Haverá este consumo feliz quando o resultado for vitorioso. Mas haverá o consumo com cobrança e intolerância na derrota.
Há diversas causas aí. A religião é uma delas. Muitos querem que o gol tenha sido obra do divino, do mito, de algum deus de plantão. Os agradecimentos em campo com o dedo apontando para o céu bem o demonstram. A Fifa já pediu para que jogadores se abstenham de levar para os gramados seus ritos religiosos. Mas quem a Fifa pensa que é perto de um deus? Se é assim, a vitória é divina e talvez o treino e a preparação possam ser mais suaves ou malandros, afinal Deus não é brasileiro? Se é, traiu o Brasil.
Na entrevista após o jogo (só na entrevista!) a comissão técnica da seleção se saiu bem. Conseguiu não se deixar sofrer a carnificina da grande imprensa que buscava uma primeira página sangrenta. Ou confessional. Coisas como lágrimas, arrependimentos viscerais e autoflagelação. Ninguém ali é bobo. Já conhece o padrão-abutre dos jornalões e TV com sua busca pelos 5 fatores: medo, pânico, caos, escândalo e terror. O problema é que jogo não é entrevista.
Renato Maurício Prado, poderoso especialista em futebol, disse que ‘Nunca antes na história desse país, a seleção brasileira foi tão humilhada numa Copa’. O mestre exagera no termo. Humilhação é um fator que requer uma conduta ofensiva do agente adversário. A Alemanha não humilhou ninguém. Portou-se com extremo profissionalismo e ética na partida. Cobrar humilhação da seleção brasileira talvez não seja o mais exato.
O antropólogo Roberto DaMatta entrevistado no O Globo, logo no dia seguinte, 9.7.14, ensina: “Existem ganhadores e perdedores. Ganhar e perder são elementos constitutivos da estrutura de uma competição”. Mas este equilíbrio mental, esta organização na interpretação de um esporte que passou a difundir fanáticos como o padrão de amor à camisa, não se quer. A sociedade da intolerância só quer saber dos fanáticos. Galvão Bueno com sua voz de gasguita se orgulha em dizer que o torcedor é ‘fanáááático’. Como se fanatismo não fosse uma patologia.
A seleção perdeu feio. Assistir 5 gols em menos de meia hora foi surreal. Chegar a um placar negativo de 7 é estarrecedor. Mas não se pode querer que o time nem o povo se sintam humilhados ou envergonhados. Humilhação é outra coisa, não pode se dar com um ‘mero’ jogo de futebol.
Agora é pegar a Holanda e se virar como puder. E torcer para que a querida irmã Argentina seja a campeã do mundo. No Brasil, o que nos deve envaidecer muito.