Nosso objetivo não é engrandecer um homem, o Presidente Lula, mas homenagear, como brasileiro que ama esta terra e esta gente, o que este homem tem provado, em pouco tempo, depois de tanto preconceito e perseguição ideológica, do que somos capazes diante de nós mesmos, e do mundo, e que não sabíamos, e não vivíamos isto, por incompetência ou fraude de tudo e todos que nos governaram até aqui. Não engrandecemos um homem, mas o que ele pagou e tem pago, para provar do que somos.
A falta de cerimonia exibida por tantos colunistas conservadores para emplacar Marina Silva de qualquer maneira como candidata presidencial do PSB, menos de 24 horas depois da morte de Eduardo Campos, é um sintoma de vários elementos da campanha de 2014. O maior é o receio de que Aécio Neves já tenha chegado a seu limite eleitoral – muito longe daquilo que seria necessário para dar a seus aliados esperanças reais de vencer o pleito – e é preciso encontrar um atalho para tentar derrotar Dilma. Desse ponto de vista, a oportunidade-Marina veio a calhar. Ao contrário de Aécio Neves, herdeiro identificado com o mais tradicional conservadorismo brasileiro, onde até a denúncia de caráter moral se compromete com a descoberta da pista de aeroporto de R$ 14 milhões na fazenda do tio-avô, Marina consegue apresentar-se como candidata do “novo.” Uma década de esforço permanente para criminalizar a política a pretexto de combater a corrução não poderia deixar de produzir resultados. O mais visível deles, na campanha de 2013, é Marina. Foi adotada por eleitores , especialmente jovens, sem partido político, para quem todo político é ladrão e só pensa em se arrumar. Basta reparar quais foram partidos que Marina frequentou e quais aliados cultivou ao longo de sua já longa existência política para ponderar o que há de verdade e de mentira nessa visão – mas este é assunto para um longo debate politico, destinado a proteger e recuperar nossos valores democráticos. Basta registrar que sua assessoria é formada por economistas que transformaram a austeridade e o baixo crescimento num horizonte de busca permanente, usando o argumento ecológico como instrumento para impedir o crescimento econômico. Veja só. Ao contrário de conservadores tradicionais, partidários de políticas de austeridade por um período determinado, para derrubar a inflação, por exemplo, eles defendem o baixo crescimento como um valor em si. Sei que é meio difícil de acreditar, num país que tem tanto emprego para criar, tanta infraestrutura para desenvolver, tanta carência para sanar. Mas é verdade. Referindo-se a preservação ambiental, o mais conhecido deles, Eduardo Gianetti da Fonseca, já foi capaz de dizer que é preciso combater o consumo excessivo…de carne e leite. Juro. Para ele, como ninguém respeita os padrões ambientais, é preciso encarecer o preço dessas proteínas para que o consumo seja reduzido. Está lá, no livro “O que os economistas pensam sobre sustentabilidade,” página 72 e seguintes: “Comer um bife é uma extravagância do ponto de vista ambiental. O preço da carne vai ter de ser muito caro, o leite terá de ficar mais caro. Tudo o que tem impacto ambiental vai ter de embutir o custo real e não apenas monetário. Essa é a mudança decisiva.” Aderindo a palavra de ordem do candidato vizinho de palanque, que falou em medidas impopulares, Gianetti admite na mesma entrevista: “O caminho que estou propondo é sofrido.” Seu parceiro ideologico, André Lara Rezende, advoga ideias curiosas, próprias de quem admite uma postura de subordinação entre nações. Para ele “a questão Estado-Nação ficou ultrapassada.” Depois de apontar para um futuro onde uma catástrofe ecológica capaz de reduzir a humanidade para 500 milhões de pessoas (hoje somos sete bilhões) já se tornou “irreversível” e “tangível”, Lara Rezende advoga o baixo crescimento, também, mas adverte: “crescimento material com Ecologia é difícil.”
É certo que uma candidata com essas ideias teria uma vida difícil no PSB, partido nascido à sombra de Miguel Arraes, o líder popular que resistiu a ditadura de forma exemplar, chegando a ser preso em Fernando de Noronha para não entregar o cargo que os generais de 64 pretendiam lhe tomar. Imagine esses cidadãos no comando da política econômica um partido que pede votos em sindicatos de trabalhadores e que, em 2014, conseguiu apoio de lideranças operárias de tradição, como Ubiraci Dantas de Oliveira, o veterano Bira, metalúrgico de São Paulo, que já era possível encontrar em comícios do 1o de maio no final dos anos 1970, e que hoje é dirigente da CGTB (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil). Ninguém deve ignorar que Marina e Eduardo Campos fizeram um casamento de conveniências quando a presidente da ex-Rede ficou sem partido. Campos lhe abriu uma legenda, na esperança de receber uma necessária transferência de votos. Marina conquistou um palanque, indispensável para quem corria o risco de ficar calada em 2014. Mostrando uma grande capacidade política para agregar apoios e somar contrários, Eduardo Campos transformou-se no grande ponto de equilíbrio político dentro do PSB. Era o protetor de Marina, o que pedia tolerância para suas opiniões e divergências. Querer usar a tragédia do Guarujá para alterar a natureza desse acordo é cometer uma violência. Numa comparação abusada, mas que faz sentido do ponto de vista das diferenças entre PSB e a Rede, o verdadeiro partido de Marina, seria igual a chamar Michel Temer para ser titular na chapa do PT — caso Dilma Rousseff fosse impedida de disputar a presidência por uma razão qualquer. Um elemento a favor da escolha de Marina não chega a ser especialmente “novo,” como gostam de enxergar seus aliados. Espera-se que, com sua popularidade, ela ajude o partido a engordar a bancada de parlamentares, estaduais e federais. Isso costuma acontecer, mas nem sempre. Em 2010, num caso clínico de sucesso individual, Marina chegou perto de 20% dos votos como candidata presidencial mas não conseguiu acrescentar um único novo parlamentar à bancada do Partido Verde — desempenho que está na origem de boa parte de suas dificuldades para permanecer no PV.
Ainda assim, a popularidade de Marina provoca justo temor no PSDB, pois pode transformar-se numa candidatura capaz de atropelar Aécio e jogá-lo para terceiro lugar e fora da campanha no segundo turno, o que seria, para os tucanos, uma derrota pior que todas as outras desde 2002.
Para o PT, a recíproca, no caso, também é verdadeira. Para o QG da campanha petista, o cenário ideal – fora a hipotética vitória em primeiro turno, cada vez menos realista – é enfrentar Aécio Neves numa segunda votação. Os petistas sempre estiveram convencidos de que, num segundo turno, a maioria dos parlamentares, dirigentes e eleitores do PSB não serão capazes de abandonar a própria história para votar no PSDB, que sempre denunciaram como partido conservador, e farão o caminho de volta para uma aliança com o PT. Era com essa possibilidade que Dilma e Lula sempre trabalharam nos últimos meses. Evitaram atitudes hostis e indelicadas, reservado a artilharia mais pesada para Aécio. Qualquer mudança, neste horizonte, irá atrapalhar os planos de Dilma. E é por isso que nossos conservadores já apostam em Marina.
Poderia ter esperado mais um ou dois mandatos presidenciais, jovem que era, e não seria pouca a chance de que viesse a ser o nome da esquerda unida para contendas futuras. Açodado, e pressionado por um partido sem identidade nacional, virou presa da mosca
Não tenho dúvidas que, nos últimos tempos, o ex-governador pernambucano, movido pelas ambições eleitorais da velha política, passou a se compor com o campo conservador. Aproximou-se de Aécio Neves e tentava construir uma frente comum para desgastar o PT e o governo Dilma.
A terceira via de Eduardo Campos, a bem da verdade, era tão verdadeira quanto uma nota de três reais. Na prática, sua aliança com Marina representava um segundo projeto dentro do bloco de partidos e classes que sustenta a candidatura do PSDB, alinhavado pelos mesmos interesses do capital rentista.
Mas havia uma diferença relevante: a trajetória histórica. O líder socialista fora, ao lado de seu avô Miguel Arraes, peça decisiva para a composição do núcleo duro da coalizão que se formara ainda em 1989 e acabaria por levar Lula à Presidência. Seu ninho era o acordo estratégico entre PT, PCdoB e PSB.
Poderia ter esperado mais um ou dois mandatos presidenciais, jovem que era, e não seria pouca a chance de que viesse a ser o nome da esquerda unida para contendas futuras. Açodado, e pressionado por um partido sem identidade nacional, virou presa da mosca azul do antipetismo.
Não foi apenas sua, no entanto, a responsabilidade pela ruptura do PSB com o partido de Lula e Dilma. A verdade é que o PT optou por renunciar à construção de uma aliança estratégica de esquerda, ao redor da qual se aglutinariam correntes de centro e até de direita, mas subordinadas à hegemonia e ao programa progressistas.
Questões da governabilidade empurraram os petistas para a predominância de uma frente tática, tendo no PMDB seu principal parceiro. Não foram poucas as forças e lideranças tradicionais do campo popular a se afastarem do governo por conta dessa estrutura de alianças.
Eduardo Campos talvez tivesse, nessa lógica, bons motivos para brigar com o PT, mas o fez pelas piores razões. A falta de organicidade de seu partido, em vários estados mera legenda para grupos conservadores, pavimentou o caminho mais fácil, comum a quase todos que romperam com o projeto petista desde 2003: a zona de conforto dos dissidentes costuma ser alguma trincheira ao lado da direita oligárquica, mesmo quando permanecem em seu próprio quadrado.
Ainda assim, sua morte merece o pranto e o respeito de todos os homens e mulheres de esquerda. Não por seu presente, tão contraditório com seu passado, mas por sua história e a de sua família.
BRASIL TRATARÁ EXPLORAÇÃO DA MORTE DE CAMPOS COMO TRATOU DERROTA DA SELEÇÃO
EDUARDO GUIMARÃES
Erram de novo os que subestimam o povo brasileiro; torceram para que a derrota dolorosa da Seleção fosse debitada à presidente da República assim como torcem para que aumentem os votos no candidato – ou candidata – que substituir Campos
Mal havia sido anunciada a morte trágica e dolorosa de Eduardo Campos e já começava uma asquerosa exploração política da tragédia, em um crescendo da mais pura falta de vergonha, de hipocrisia, de teorias conspiratórias absurdas e baseadas em absolutamente nada.
No Twitter, mensagem de um autoproclamado “pastor” já mostrava o nível de falta de noção, de brutalidade, de oportunismo, de hipocrisia que conspurcaria um momento em que a democracia brasileira estava sofrendo forte abalo, com a morte de um homem que estava exercendo um papel que precisa ser exercido, de oferecer ao país uma proposta alternativa.
Teorias conspiratórias com finalidade política se espalharam. Nas redes sociais, militantes de partidos políticos tentaram vincular o número eleitoral do PT (13) à data da morte de Campos. No portal de um grande jornal, “notícia” de que a morte do candidato do PSB teria gerado “Pânico no mercado financeiro”.
Passadas cerca de cinco horas da divulgação da tragédia, começa a tomar forma uma postura que se tornaria chocante. O portal do jornal O Globo noticia que Antonio Campos, irmão de Eduardo Campos, dera entrevista na qual pregara que Marina Silva substitua Campos como candidata do PSB a presidente.
Mas seria à noite, já nos primeiros minutos do Jornal Nacional, que o mesmo Antonio Campos daria uma declaração chocante. Ao falar sobre a morte do irmão, fez uma declaração que pode até ser vista como produto de desorientação, mas que, associada à declaração anterior, deu impressão de cálculo político.
Fica difícil não perguntar por que a morte de Campos deveria gerar uma “reflexão sobre os destinos do país”. Sim, o candidato pelo PSB morreu lutando por seus interesses políticos, o que é absolutamente legítimo. Porém, a fala de seu irmão permitiria até inferir que ele foi vitimado por algum adversário, quando foi vítima de uma fatalidade da qual adversário nenhum tem culpa.
A morte de Campos tem o poder de nos fazer refletir sobre a frágil e efêmera condição humana, mas de forma alguma tem o condão de gerar reflexões sobre o destino do Brasil, sobretudo sobre como o Brasil votará, pois uma fatalidade influir na decisão eleitoral deste povo equivaleria ao povo decidir em quem votará para presidente por conta da derrota da Seleção na Copa de 2014.
Mais adiante, no mesmo Jornal Nacional, a previsível tentativa da Globo de extrair lucro político da morte de Campos. Ao reproduzir as falas dos candidatos a presidente sobre a tragédia, o telejornal escolheu manifestação condoída e emocionada de Aécio Neves e um momento menos emocionado da manifestação de Dilma.
Dilma disse o mesmo que Aécio e emocionou-se tanto quanto ele – ao menos aparentemente – apareceu emocionado ao falar para as câmeras do Jornal Nacional, mas a emoção de Dilma não convinha à Globo.
Erram de novo os que subestimam o povo brasileiro. Torceram para que a derrota dolorosa da Seleção fosse debitada à presidente da República assim como torcem para que aumentem os votos no candidato – ou candidata – que substituir Campos. Vão quebrar a cara. De novo.
Não há espaço mais a ser ocupado com a extinção de Eduardo nestas eleições. Marina, se for alçada à candidata se dará por pragmatismo eleitoral e por pressão dos colunistas da velha mídia
"A imagem que vou lembrar dele é a da nossa despedida, ontem à noite, em alegria. Ele estava cheio de sonhos, cheio de planos". Assim Marina Silva definiu a lembrança que disse que vai guardar de Eduardo Campos. Essa era um pouco a imagem que tinha dele, tão arraesista quanto brizolista que sou, ainda que petista, por reivindicar o legado luminoso da esquerda brasileira como um todo na saga pela independência política e econômica do país.
Tive a honra de assistir à festa da vitória do primeiro mandato de Eduardo no Marco Zero de Recife, ladeado por Ariano Suassuna e muito frevo, numa campanha em que PSDB, DEM e Jarbas Vasconcelos, então varridos pelo povo com muito apoio do ex-presidente Lula, não pouparam ataques criminosos contra o recém-falecido governador Miguel Arraes. Aliás, nos idos de 1998, quando "oPTei" por servir ao povo como causa de vida, achava uma estupidez quando alguns setores do PT gritavam "Arraes, velho caduco, Pinochet de Pernambuco" tão quanto tinha vergonha alheia por uma outra que propunha "vou entrar de sola, fazer reforma agrária na fazenda do Brizola".
Vez por outra escutava de uma parente próxima críticas a ele, sobre como "dominou" o parlamento pernambucano, o judiciário, quanto era "pragmático", até o quanto influenciava os demais partidos políticos desde fora dos mesmos. Eu ouvia e não deixava de admirá-lo, pois, na verdade, reconverteu o legado do avô em hegemonia política. Ou, como ele mesmo disse reagindo às críticas do Financial Times sobre ser um "coronel moderno": este tipo de crítica só se faz contra quem nasceu no Nordeste. E estava correto. Nunca ouvi ninguém dizer o mesmo de Aécio Neves, por exemplo, embora todos saibam que Minas é, politicamente, uma província dominada por sua família, o que não era o caso de Pernambuco. E ele foi popular pelos programas sociais e de infraestrutura, foi símbolo do novo tempo do Nordeste que não é mais aquele da Asa Branca ou o cantado por Luiz Gonzaga. E foi com apoio do pernambucano-operário-presidente.
Em artigo recente escrevi: "há um temor do 'lado de lá' de que pode surgir um bipartidarismo democrático no Brasil que tenha polos unificados sob parâmetros realmente próximos, como o papel do Estado, a necessidade de seguir uma dinâmica econômica distributivista, uma política externa soberana, ainda que mais ou menos pragmática". A divisão dos votos com o PSDB, ainda que em desvantagem, mostrou claramente esta janela de oportunidades para melhor ao país. Claro que recentemente demonstrou seus limites, mas fazer o que, afinal nova politica é o que temos feito: universalizar serviços públicos, distribuir renda, expandir direitos civis e "exportar" este modelo de forma soberana. Mas, a chapa liderada por Eduardo poderia, por exemplo, cumprir o papel de pautar com força o tema do desenvolvimento(e da desigualdade) regional e o necessário aprofundamento da cooperação federativa, que é uma agenda inadiável do país e, assim, as eleições de 2014 poderiam se diferenciar das três últimas eleições presidenciais para melhor, para não ser refém dos factóides e diatribes dos jornalões querendo alavancar uma oposição de projeto inconfessável para a Nação.
Não há espaço mais a ser ocupado com a extinção de Eduardo nestas eleições. Marina, se for alçada à candidata se dará por pragmatismo eleitoral e por pressão dos colunistas da velha mídia, que já se arvoram em desrespeito ao luto da família. Ele, Eduardo, infelizmente não poderá pôr a sua agenda adiante. E a agenda de Eduardo é o exemplo que fica, que não é a mesma de Marcio França e nem a de Marina Silva. É a agenda do exemplo a jovens políticos. Não este mimimi "de 15 a 29 anos", mas o que se pode chamar de verdadeira nova geração, "45 a bajo", como diriam os amigos da La Cámpora argentina. A agenda do idealismo com capacidade propositiva e de planejar associado à capacidade de agir nas condições concretas, mas projetando um futuro que não se encerra na práxis política sobre a qual se pisa. Que isso fique, junto com o que o socialismo constitucional do PSB, o arraesismo, representou e representa de bom para o país e que tanto ajudou Lula e Dilma no caminho da construção da soberania nacional e da justiça social.