O Teatro Nacional estava repleto, como foi noticiado, na noite de terça-feira, 16 de novembro, na abertura do Festival de Cinema de Brasília. As breves e desnecessárias palavras do produtor Luiz Carlos Barreto registraram preocupação com a superlotação do local. O que não é seguro afirmar é que poderia ser diferente. A obra que mobilizou uma multidão é parte de um mesmo fenômeno que desde Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, nos idos dos anos 70, não para de mover o povo brasileiro com respeito e admiração: Lula, que Denise Paraná como escritora, e agora os Barreto, chamam “o filho do Brasil”.
Uma história de sofrimentos é verdade, mas principalmente, uma história de amor e superações. Um menino que sonha, um adolescente com seu primeiro amor e a conquista de um diploma que muda sua vida, um homem que chora e que luta. Um amigo decente, um bom filho. Uma pessoa que se preocupa com as outras.
No filme não tem o Lula no PT, criando o partido que se tornou referência para muitas vitórias dos trabalhadores no Brasil e no mundo. Nem o Lula presidente, que vai dando nova cara para o estado brasileiro, criando políticas de inclusão e que preparou o Brasil para encarar a crise econômica mundial de 2008. Mas sendo tantos os papéis em uma só pessoa, esses já estavam lá, no moleque vendedor de laranjas que mal alcança a cintura do pai, mas o enfrenta para proteger a mãe da violência deste.
Ainda assim, com todos os méritos, o Lula personagem não é o maior dos gigantes na tela. E isso não se deve a ele, ou ao ator que, aliás, o interpreta de forma segura e verossímil, algo bastante complexo quando se trata de viver, em vida, um personagem sem igual na história brasileira. É que não dá pra ser maior que dona Lindu na sua plena condição de mãe.
Dona Lindu ocupa o filme inteiro porque é o caminho seguro por onde seus meninos e meninas pisam numa vida difícil. Ela está em todas as cenas, em todos os momentos, sofre as dores do parto a cada dia para dar o que comer aos filhos, para protegê-los de maus tratos, para assegurar que possam ir à escola. Acima de tudo ela acredita na família que mantém, confia em seus filhos e forma com eles um núcleo que os ensina pelo exemplo a serem bons e enfrentarem com altivez os momentos duros. A mulher que atravessa o Brasil com as crianças agarradas a todos os lados do seu corpo, responde não à professora que se oferece para fazer do pequeno Lula “alguém na vida”, adotando-o de papel passado. “Ele já é alguém: é o Luiz”, diz a mãe. “Ele já tem futuro, vai estudar, trabalhar”, completa.
A figura de Dona Lindu emociona, não apenas pelo impecável trabalho de Glória Pires, mas pelas cenas em si, a mãe que leva o filho a se inscrever para a prova de seleção do curso técnico do Senai e o esforço do menino que abraça apertado essa oportunidade. A formatura tem o choro mais bonito de mãe: a emoção da vitória, porque a maior vitória de mãe é aquela que ela enxerga nos olhos de um filho.
O mais relevante de assistir ao filme de dona Lindu é perceber quanto de amor pode existir na condição de ser mãe. Esse amor que é entrega, que cuida de si porque essa é condição para cuidar do outro. Amor que partilha amor, do mesmo modo que faz com o pão: o melhor pedaço é teu meu filho, porque eu te amo. Nessa hora, nesse instante, mesmo que o dia tenha sido de trabalho e dor, mães inventam o que vai ser servido aos filhos e fazem muito do pouco.
Outras, se debruçam pra ajudar seus filhos nos temas da escola, curam suas feridas, ou até mesmo procuram encontrar caminhos de integração a um mundo hostil, quando seus meninos ou meninas possuem deficiências. Algumas mães estão rindo das apresentações improvisadas com panelas que se transformam em tambores espalhados por toda a cozinha. Irmãos brigam, choram e logo se abraçam. Diante de um machucado, um beijo de mãe é melhor remédio do que qualquer um da indústria farmacêutica.
Dona Lindu nos faz apreciar e sobretudo valorizar esse amor, que não é piegas, mas só amor. Lembrei da minha mãe, dona Hilda, e da mãe que todos os dias eu quero muito ser, e acredito que tem mais energia nesse amor do que em toda a camada Pré-Sal. Ainda que ela seja muito importante pro Brasil, é claro.
* Maria do Rosário é filha de Hilda, mãe de Maria Laura, professora, pedagoga e Deputada Federal (PT/RS) – Presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados Acesse o site da Deputada: www.mariadorosario.com.br