RETRATO DO BRASIL DESNUDA "JUÍZO MEDIEVAL" DA AP 470
Vídeo produzido pela revista Retrato do Brasil, do respeitado jornalista Raimundo Rodrigues Pereira, desmonta acusações feitas pelo relator Joaquim Barbosa a determinados dos réus da Ação Penal 470; segundo ele, algumas condenações, como a de João Paulo Cunha, teriam sido armadas pelo atual presidente do Supremo Tribunal Federal com "mentiras escandalosas"; vídeo é apresentado pelo escritor e jornalista Fernando Morais; assista
23 DE SETEMBRO DE 2013 ÀS 20:36
247 - Um vídeo didático, de 27 minutos e 26 segundos, acaba de ser postado no YouTube e traz revelações surpreendentes sobre a Ação Penal 470, que tratou do chamado "mensalão". Produzido pelos jornalistas Raimundo Rodrigues Pereira e Lia Imanishi, editores da revista Retrato do Brasil, e apresentado pelo escritor Fernando Morais, o vídeo acusa o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, de ter armado as condenações de alguns réus com "mentiras escandalosas".
Uma delas, por exemplo, seria a que ancorou a condenação do deputado João Paulo Cunha (PT-SP). Numa das sessões do julgamento, Barbosa afirmou que a contratação da agência de publicidade DNA pela Câmara dos Deputados, à época presidida por João Paulo Cunha, teria sido reprovada por várias instâncias de controle. Raimundo Pereira e Lia Imanishi demonstram o contrário.
Em outro capítulo do vídeo, os jornalistas desmontam a tese do "desvio de recursos públicos" por meio da Visanet. Raimundo demonstra que os gastos autorizados pelo Banco do Brasil foram efetivamente pagos e que um dos maiores beneficiários da campanha foi justamente a Globo, que moveu dura campanha contra os réus no que chamou de "julgamento do século".
O vídeo foi publicado no YouTube com o título "Mensalão, AP 470, julgamento medieval". Curiosamente no mesmo dia em que o jurista Claudio Lembo, um dos mais notórios conservadores do País, também definiu o processo como um "juízo medieval".
Assista abaixo e forme seu próprio julgamento:
http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/115743/Retrato-do-Brasil-desnuda-ju%C3%ADzo-medieval-da-AP-470.htm
IVES GANDRA: UMA NO CRAVO, OUTRA NA FERRADURA
DAVIS SENA FILHO
O STF se tornou uma Casa política enquanto deveria ser uma Casa de guardar e resguardar as leis e assegurar ao cidadão e à cidadania o acesso ao Direito, além de proteger o estado democrático de direito
Quando li a entrevista do advogado conservador Ives Gandra Martins na Folha de São Paulo ao afirmar que o ex-ministro José Dirceu não cometeu crimes porque eles não foram provados, bem como considerou que os embargos infringentes são justos, além de dizer que o domínio do fato é um absurdo jurídico e que até na Alemanha não é usado, em um primeiro momento pensei que o famoso jurista de direita e por ela admirado tivesse mudado seu pensamento sobre o ordenamento jurídico, mas logo voltei à tona e percebi que não é bem assim que a banda toca no caso das opiniões de Gandra.
A verdade é que não acreditei no que estava a ler. O conhecido jurista e tributarista, adversário tradicional do PT e das esquerdas, além de “tribuno” da imprensa de negócios privados e do Instituto Millenium, é advogado de grandes corporações comerciais e de empresários de diferentes segmentos da economia, muitos deles talvez investigados pela Receita Federal, porque respondem no Judiciário por inúmeros processos de sonegação de impostos, remessas ilegais de dinheiro para paraísos fiscais e todo tipo de transgressões fiscais, que prejudicam a arrecadação do fisco e a sociedade brasileira, que fica sem o dinheiro sonegado que poderia, por exemplo, ser investido em saúde e educação.
Ives Gandra não dá ponto sem nó. Contudo, ele pode perder espaço na imprensa corporativa controlada por magnatas bilionários, que podem retaliá-lo por causa de suas considerações publicadas na Folha de S. Paulo, que, evidentemente, não deu destaque de primeira página para a entrevista da jornalista Mônica Bérgamo. A velha e elitista imprensa é matreira e compreende que poderá ser alvo de peripécias e arranjos jurídicos, como o domínio do fato, ou ter negado o direito aos embargos infringentes, a exemplo do que quiseram fazer com os réus do “mensalão” — o maior mentirão da história do Brasil e que vai ser, indelevelmente, comprovado pelo tempo.
Pensemos, porventura, se um de seus barões algum dia tenha de dar satisfações às suas supostas ilegalidades exemplificadas em crimes tributários e fiscais contra o estado, a economia popular e que, consequentemente, podem ocasionar prisões. Certamente que os áulicos, os bajuladores e porta-vozes das famílias midiáticas de costumes e caracteres lacerdistas e udenistas imediatamente vão mudar seus discursos e dessa forma compor com os interesses de seus patrões, porque sabemos que os empregados dos magnatas bilionários da imprensa alienígena mudam de opinião tal qual o vento muda de direção.
Não acredito que Ives Gandra tenha mudado de pensamento e postura. Pessoas de passado de luta política como José Dirceu, José Genoíno, João Paulo Cunha e Delúbio Soares, por exemplo, e que comportam o núcleo político do mentirão, estão a ser linchadas e execradas publicamente há oito anos, sem culpa comprovada, e o senhor jurista tributarista jamais abriu a boca para defender que eles tivessem o pleno direito de defesa, ao contraditório e que pudessem, ao menos, ter acesso a instrumentos jurídicos, como os embargos infringentes, que servem exatamente para corrigir quaisquer exageros, erros e injustiças na hora final de se fazer justiça quando o juízes do STF batem seus martelos de forma derradeira e aplicam as punições.
Agora, Gandra se diz favorável aos embargos e se junta ao professor emérito de Direito, ex-reitor da Universidade Mackenzie e ex-governador de São Paulo, Cláudio Lembo, ambos considerados figuras de proa do pensamento conservador. Contudo, Lembo já deu mostras de ser um homem centrado e sensato em inúmeros episódios exemplificados nos casos da organização criminosa PCC, que amedrontou a sociedade paulista, como nunca se viu antes no Brasil, bem como criticou a “elite” brasileira, em 2006, ao afirmar: "Nós temos uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa. A bolsa da burguesia vai ter que ser aberta para poder sustentar a miséria social brasileira no sentido de haver mais empregos, mais educação, mais solidariedade, mais diálogo e reciprocidade de situações". Incrível, mas é o que disse o professor Cláudio Lembo, um homem que no passado pertenceu à Arena e ao PDS fazer afirmativas tão contundentes e inapelavelmente verdadeiras.
Depois de o decano do STF, juiz Celso de Mello, ter votado a favor dos embargos infringentes, muitas autoridades e personalidades proeminentes e ideologicamente conservadoras passaram a rever certos fundamentos jurídicos levados a cabo notadamente pelos juízes Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio de Mello e os aposentados Ayres Britto e Cezar Peluso. O decano também faz parte da turma pertencente à ala que opinou fortemente contra o PT, seus integrantes e os réus do “mensalão”. Ele deu declarações fortes, pois não condizem com a posição de um juiz que está prestes a punir e condenar à prisão seres humanos e cidadãos que estão a se defender e por isto necessitam que todas suas garantias constitucionais sejam preservadas por juízes que são os guardiões da Constituição.
Além disso, o Regimento do STF estabelece que os réus que tiveram quatro votos a favor da absolvição podem se valer dos embargos infringentes para contestar condenações. E foi o que aconteceu com 11 dos réus, mas os proprietários das mídias, por intermédio de seus empregados que deitam falação e conceitos propositalmente errados e equivocados para gerar confusão e desinformação na sociedade, deturpam a verdade, porque querem fazer crer que está a acontecer impunidade e irresponsabilidade por parte do Tribunal, que apenas há poucos dias era considerado por essa gente da imprensa comercial e privada e por parte da classe média coxinha o Olimpo das virtudes humanas ou o Umbral onde os espíritos vão expiar suas imperfeições. Durma-se com um barulho desse.
O STF se tornou uma Casa política enquanto deveria ser uma Casa de guardar e resguardar as leis e assegurar ao cidadão e à cidadania o acesso ao Direito, além de proteger o estado democrático de direito. Só que juízes do naipe de Gilmar Mendes, Marco Aurélio de Mello, Luiz Fux, dentre outros, na ativa ou não, recusam-se a cumprir seus papéis de magistrados, porque se tornaram agentes políticos, que tratam, inclusive, de política partidária, são ideologicamente conservadores e combatem os governos trabalhistas nos últimos 11 anos, de forma sistemática e de forma pública e notória. Só não percebe quem não quer, ou está no mundo da lua.
Ives Gandra, a meu ver, deu uma no cravo e outra na ferradura. Se ele teve boa intenção no que diz respeito a ficar ao lado da Constituição e respeitar o Regimento do STF, parabéns ao jurista. Por seu turno, sabe-se que Gandra advoga para gente rica e poderosa e que, certamente, no decorrer de seus processos, reivindicarão os embargos infringentes, inclusive a Globo, acusada de sonegar cerca de R$ 1 bilhão, bem como os tucanos paulistas, que estão envolvidos na lama do escândalo Siemens e Alstom, dentre muitos outros casos de corrupção que ainda vão responder na Justiça.
Afinal, pau que bate em Chico também bate em Francisco, e é exatamente dessa maneira que o Ministério Público e o Judiciário devem se comportar. Isonomia. Ives Gandra é tributarista conceituado, politicamente conservador e sempre se comportou como adversário do PT. O jurista conhece a classe rica e sabe o que está a afirmar quando se trata de olhar os dois lados da moeda. Os embargos infringentes são um direito e o acesso à ampla defesa também. A Folha de S. Paulo, do Otavinho Frias, sabe disso, e por causa disto o entrevistou. É isso aí.
A EPIFANIA DE IVES GANDRA
EDUARDO GUIMARÃES
O convite para Ives Gandra “explicar” por que era lícito mandar José Dirceu e outros de seus companheiros petistas para o cárcere sob a teoria do “domínio do fato”, partiu de ninguém mais, ninguém menos do que de Marcelo Tas
“Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”
(João 8.32)
Eis que a verdade liberta mais um cristão. E não qualquer cristão, mas um cristão militante.
O jurista Ives Gandra Martins, 78, além dos seus 56 anos de advocacia, dos livros e mais livros publicados, muitos em parceria com ministros do STF, e de ser professor da Universidade Mackenzie, da Escola do Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, é um dos primeiros brasileiros a ter ingressado na Opus Dei e seu principalsupernumerário no país.
Ives Gandra é insuspeito de ter qualquer tendência esquerdista. Na verdade, é autor de um dos textos mais reacionários e abjetos que já li, dolorosamente intitulado como “Você é branco? Cuide-se!”. Publicado há cerca de quatro anos no “UOL Mais”, pelo seu trecho inicial pode-se concluir seu caráter injusto, hipócrita e preconceituoso:
“Hoje, tenho eu a impressão de que o ‘cidadão comum e branco’ é agressivamente discriminado pelas autoridades e pela legislação infraconstitucional, a favor de outros cidadãos, desde que sejam índios, afrodescendentes, homossexuais ou se autodeclarem pertencentes a minorias submetidas a possíveis preconceitos (…)”
Barbaridade, tchê! E o pior é a conclusão:
“Como modesto advogado, cidadão comum e branco, sinto-me discriminado e cada vez com menos espaço, nesta terra de castas e privilégios”
Como negros, índios e afrodescendentes ricos oprimem os brancos pobres e ultra cristãos brasileiros, não? Pobre Ives…
Mas, enfim, esse cidadão tão oprimido pelos descendentes de escravos, entre outros déspotas, é um dos mais festejados próceres da ultradireita brasileira. Além de amigo dos supremos juízes do Supremo Tribunal e dos demais labirintos do Poder Judiciário, não por outra razão foi convidado a opinar na televisão quando a maioria do STF começou a sapatear sobre o Direito no segundo semestre do ano passado.
O convite para Ives Gandra “explicar” por que era lícito mandar José Dirceu e outros de seus companheiros petistas para o cárcere sob a teoria do “domínio do fato”, partiu de ninguém mais, ninguém menos do que de Marcelo Tas, um dos mais ativos militantes da direitona verde-amarela, apresentador do programa CQC e expoente do Instituto Millenium, onde costuma fazer dobradinha com Reinaldo Azevedo, o blogueiro pit bull da Veja.
À época, não faltaram elogios do “supernumerário” da Opus Dei ao STF. E, ao ser perguntado por Tas sobre o que estava acontecendo naquele exato momento da entrevista, exatamente enquanto o ministro Celso de Mello explicava como o “domínio do fato” embasava a condenação de José Dirceu, o jurista deu a seguinte declaração:
“Nós vamos ter, a partir dessa decisão do Supremo, um verdadeiro divisor de águas entre um passado em que havia uma certa flexibilidade, uma espécie de tolerância moral, tolerância ética com quem detinha o poder. E, a partir dessa decisão, já não se preocupou mais com aquele princípio do In Dúbio Pro Reo (se eu tiver dúvidas, sempre se vai beneficiar o réu), mas que, acima de tudo isso, está o interesse da pátria, da nação (…)”
Uau! Um novo Brasil surgia, brandindo a espada da Justiça. Essa era a opinião do mesmo homem que, na manhã do último domingo (22), após uma legítima epifania, chegou aos leitores do jornal Folha de São Paulo declarando, entre muito mais, que “José Dirceu foi condenado sem provas” e que “A teoria do domínio do fato traz insegurança para todo mundo”.
Antes de prosseguir, disponibilizo ao estupefato leitor, abaixo, vídeo contendo a entrevista completa dada por Ives Gandra a Marcelo Tas em 10 de outubro de 2012, enquanto a quase totalidade dos membros do STF massacrava um partido político e quatro réus filiados àquele partido, contra os quais nunca pesara acusação alguma além das que lhes fez a ditadura militar.
O que se tem que perguntar não a petistas ou a simpatizantes do PT, mas a qualquer cidadão detentor de uma mísera réstia de honestidade intelectual é se, por acaso, uma declaração dessa magnitude contra o julgamento do mensalão, dada por alguém que teria todos os motivos políticos e ideológicos para defender esse julgamento, não tem um peso descomunal em favor dos réus.
Para o blogueiro da Veja Reinaldo Azevedo, não tem. Além de desqualificar a competência jurídica de Ives Gandra do alto de seu “notório saber jurídico”, esse blogueiro diz anormal que os que acreditam no mesmo que o “supernumerário” da Opus Dei vejam na fala deste uma razão a mais para duvidar da Ação Penal 470, vulgo mensalão.
Para Reinaldão, em um texto imenso do qual, além do mais puro “embromation”, não se tira uma explicação aceitável para a mudança de opinião de Ives Gandra além de ele ser um néscio, o histórico deste não torna no mínimo obrigatório ver em sua análise da AP 470 um indício a mais, entre tantos outros, de que o julgamento do mensalão vem sendo, além da mais pura injustiça, uma ameaça ao Estado de Direito.
Por que incluí o Reinaldo Azevedo neste texto? Para mostrar, mais uma vez, como os linchadores de José Dirceu e cia. são caras-de-pau. Como se alguém não soubesse.