QUEM É A DIREITA BRASILEIRA?
Em artigo exclusivo para o 247, o jornalista Breno Altman disseca o pensamento da nova direita brasileira, que tem Reinaldo Azevedo como um de seus expoentes; "Sob o rótulo de 'direita democrática', o que respira é uma concepção liberal-fascista", lembra Altman. "Não é de hoje que direitistas recorrem a truques de maquiagem para não serem reconhecidos. A mais comum dessas prestidigitações tem sido a de se enrolar em supostas bandeiras democráticas para cometer malfeitos", afirma, lembrando o apoio da direita a golpes e quebras institucionais; sobre Azevedo, Altman nega que se trate de um rottweiler e o compara a um cachorrinho de madame. Ainda assim, adverte sobre o perigo que representa. "Claro que o ladrar de Azevedo e seus parceiros não é capaz, nos dias que correm, de ameaçar a estrutura democrática do país. Mas choca o ovo da serpente pelas ideias e valores que representa"; leia a íntegra
20 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 06:40
Por Breno Altman, especial para o 247
O sr. Reinaldo Azevedo, a quem injustamente referiu-se a ombudsman da Folha de S. Paulo como rottweiler do conservadorismo, continua a desmentir sua colega de redação. Qualquer comparação com uma raça canina tão forte e cheia de personalidade é realmente despropositada. Se o nobre animal lesse jornal, provavelmente se sentiria insultado. O colunista, tanto pelas posições que defende quanto por estilo, está mais para cachorrinho de madame.
Deu-nos mais uma prova, no dia 6 de dezembro, em artigo intitulado "Direita já!", de qual é o seu pedigree. A ideia básica é que falta, no Brasil, uma força política que tenha competitividade eleitoral e, abraçando claramente valores de direita, faça oposição ao governo. Ou que acredite na hipótese de se tornar dominante exatamente por defender esses valores. Ainda mais longe vai o santarrão do conservadorismo: o PT provavelmente continuará a governar porque não seria possível "candidatura de oposição sem valores de oposição".
O que Azevedo esconde do leitor, por ignorância ou má fé, são as razões pelas quais a direita brasileira atua disfarçada. Esse campo ideológico, afinal, esteve historicamente comprometido com a quebra da Constituição, o golpismo e a instituição de ditaduras. Seus valores de raiz são o autoritarismo, o racismo de índole escravocrata, o preconceito social, o falso moralismo e a submissão às nações que mandam no mundo. Vamos combinar que não é fácil conquistar apoios com essa carranca.
Não é de hoje que direitistas recorrem a truques de maquiagem para não serem reconhecidos. A mais comum dessas prestidigitações tem sido a de se enrolar em supostas bandeiras democráticas para cometer malfeitos. Exemplo célebre é o golpe militar de 1964, quando bateram nas portas dos quartéis e empurraram o país para uma longa noite de terror, em nome da liberdade e da democracia.
A ditadura dos generais foi o desfecho idealizado pela "direita democrática", depois que se viu sem chances de ganhar pelo voto e tomou o caminho da conspiração. O suicídio de Getúlio Vargas sustou a intentona por dez anos, mas os ídolos de Azevedo estavam à espreita para dar o bote. As provas são abundantes: estão presentes não apenas nos discursos de personalidades da "direita democrática" de antanho, mas também nas páginas dos jornalões da época, que clamavam pela ruptura constitucional e a derrubada do presidente João Goulart.
Algumas dissidências desse setor, a bem da verdade, tentaram se reconciliar com o campo antiditadura, depois de largados na estrada pelos generais ou frustrados com sua truculência. A maioria dos azevedinhos daquele período histórico, no entanto, seguiu de braços dados com a tortura e a repressão. Eram ativistas ou simpatizantes do partido da morte. Batiam continência como braço civil de um sistema talhado para defender os interesses das grandes corporações, impedindo a organização dos trabalhadores e massacrando os partidos de esquerda.
O ocaso do regime militar trouxe-lhes isolamento e desgaste. A direita pró-golpe, mesmo transmutada em partidos que juravam compromisso com a democracia reestabelecida, não teve forças para forjar uma candidatura orgânica nas eleições presidenciais de 1989. Acabaram apoiando Fernando Collor, um aventureiro de viés bonapartista, para enfrentar o risco representado por Lula ou Brizola. O resto da história é conhecido.
Depois deste novo fracasso, as forças reacionárias ficaram desmoralizadas e sem chão. Trataram, em desabalada carreira, de aderir a algum pastiche que lhes permitisse sobrevida, afastando-se o quanto podiam da herança ditatorial que lhes marcava a carne. Viram-se forçadas a buscar, entre as correntes de trajetória democrática, uma costela a partir da qual pudessem se reinventar. Encontraram no PSDB, capturado pela burguesia rentista, o instrumento de sua modernização e o novo organizador do bloco conservador.
A mágica acabou, porém, quando o PT chegou ao Planalto, deslocando para a esquerda boa parte do eleitorado que antes era seduzido pelo conservadorismo. Esse foi o resultado da adoção de reformas que modificaram e universalizaram providências antes circunscritas a tímidas medidas compensatórias, como parte de um projeto que permitiu a ascensão econômico-social da maioria pobre do país. Tais conquistas tingiram de cores fúnebres, na memória popular, o modelo privatista e excludente sustentado pelo tucanato.
Enquanto a direita republicana tratava desesperadamente de estabelecer vínculos entre o sucesso do governo petista e eventuais políticas do período administrativo anterior, evitando reivindicar seu próprio programa, outro setor deu-se conta que, sem diferenciação clara de projetos, seria muito difícil reconquistar maioria na sociedade e romper a dinâmica estabelecida pela vitória de Lula em 2002.
Não haveria saída, contra o petismo, sem promover a mobilização político-ideológica das camadas médias a partir de seus ímpetos mais entranhadamente individualistas, preconceituosos e antipopulares. Ao contrário de uma tática que encurtasse espaços entre os dois polos que definem a disputa nacional, o correto seria clarificar e radicalizar o confronto.
As legendas eleitorais do conservadorismo titubeiam a fazer dessa fórmula seu modus operandi, mas os meios tradicionais de comunicação passaram a estar infestados por gente como Azevedo e outros profetas do passado. A matilha não tem votos para bancar nas urnas uma alternativa à sua imagem e semelhança, é verdade. Seria um erro, no entanto, subestimar-lhe a audiência e o papel de vanguarda do atraso que atualmente exerce nas fileiras oposicionistas.
Até porque conta com uma fragilidade da própria estratégia petista, de melhorar a vida do povo através da ampliação de direitos e do consumo, mas atenuando ao máximo o enfrentamento de valores e o esforço para modificar as estruturas político-ideológicas construídas pela oligarquia, especialmente os meios massivos de comunicação. O PT logrou formar maioria eleitoral a partir dos avanços concretos, mas não impulsionou qualquer iniciativa mais ampla para estabelecer hegemonia cultural e ideológica.
Seria persistir neste equívoco não dar o devido combate ao conteúdo programático do discurso azevedista. Sob o rótulo de "direita democrática", o que respira é uma concepção liberal-fascista, forjada na comunhão das ditaduras chilena e argentina com a escola de Chicago e os seguidores do economista austríaco Ludwig Von Mises.
O velho fascismo, que trazia para dentro do Estado as operações dos conglomerados capitalistas, tornando-os parasitas econômicos da centralização política, efetivamente caducou como resposta aos próprios interesses grão-burgueses. Entre outros motivos, porque retinha parte ponderável da taxa de lucro para o financiamento do aparato governamental.
A combinação entre ultra-liberalismo e autoritarismo converteu-se em um modelo mais palatável entre as elites. O Estado assumia as tarefas de repressão e criminalização das lutas sociais, na sua forma mais perversa e violenta, soltando as amarras legais e sociais que regulavam o desenvolvimento dos negócios em âmbito privado. Não eram à toa os laços afetuosos que uniam Margaret Thatcher e Ronald Reagan ao fascista Pinochet. O neoconservadorismo se trata, afinal, do liberal-fascismo sem musculatura ou necessidade de realizar seu projeto histórico até o talo.
Claro que o ladrar de Azevedo e seus parceiros não é capaz, nos dias que correm, de ameaçar a estrutura democrática do país. Mas choca o ovo da serpente pelas ideias e valores que representa. A melhor vacina para a defesa da democracia, contudo, como dizem os gaúchos, é manter a canalha segura pelo gasganete. Os latidos dos cachorrinhos de madame devem ser repelidos, antes que se sintam à vontade para morder.
Breno Altman é jornalista, diretor editorial do site Opera Mundi e da revista Samuel.
http://www.brasil247.com/pt/247/poder/124607/Quem-%C3%A9-a-direita-brasileira.htm
PT CRITICA MATÉRIA DA FOLHA: "CORVOS DE ALUGUEL"
Em nota publicada na página do partido no Facebook, sigla critica a forma como o jornal de Otavio Frias tratou os dados apresentados pelo IBGE, que mostram o menor índice de desemprego alcançado no Brasil na série histórica do estudo (desde 2002), com 4,6%: 'Conservadora, reacionária e alinhada ao antipetismo mais rasteiro em circulação nas redes sociais, a mídia brasileira embaralha os conceitos de liberdade de imprensa e de expressão para esconder oposição ao Brasil'
20 DE DEZEMBRO DE 2013 ÀS 05:31
247 – O PT divulgou uma nota no Facebook criticando a Folha de S. Paulo pela matéria em que divulga dados do IBGE sobre o desemprego. O Brasil fecha o ano com o menor índice alcançado na série histórica do estudo (desde 2002), com 4,6%. Porém, para o PT, a forma como a Folha tratou o assunto coloca ao lado da mídia “conservadora, reacionária e alinhada ao antipetismo mais rasteiro em circulação nas redes sociais.”
Leia:
CORVOS DE ALUGUEL
CORVOS DE ALUGUEL
Divulgado, hoje pela manhã, pelo IBGE, o índice de desemprego no Brasil em novembro, de 4,6%, é um emblema dos tempos em que vivemos, em muitos sentidos.
Na seara civilizatória, equivale dizer que em meio a um mundo assombrado pela falência múltipla das maiores nações capitalistas, o Brasil se impõe como um modelo econômico ao mesmo tempo sólido e solidário, com antenas voltadas para o futuro e raízes firmes na realidade presente.
Somos um país que compra aviões de caça de última geração, mas que tem como bandeira fundamental a erradicação da fome, da pobreza e da injustiça social.
No entanto, embora os dados de novembro do IBGE revelem a menor taxa de desemprego da história do Brasil, essa circunstância serve também para expor, ainda mais, o depositório de ressentimentos que virou boa parte da mídia brasileira.
Conservadora, reacionária e alinhada ao antipetismo mais rasteiro em circulação nas redes sociais, a mídia brasileira embaralha os conceitos de liberdade de imprensa e de expressão para esconder suas verdadeiras intenções. Esconder que, ao se vender como oposição política, faz oposição ao Brasil.
Não a qualquer Brasil, mas a este Brasil da última década, o Brasil de pleno emprego, o Brasil dos governo do PT.
O Brasil de todos.
É preciso ler o primeiro parágrafo da matéria publicada, hoje, na Folha de S.Paulo, sobre o menor desemprego da história do País, para se entender a dimensão desse ressentimento sem fim.
Diz a Folha, primeiro:
“Apesar do menor ritmo da economia no terceiro trimestre, da freada do consumo e do crédito restrito, as empresas não lançaram mão ainda de demissões e a taxa de desemprego segue em níveis baixos.”
Trata-se de um “nariz-de-cera”, como se diz no jargão jornalístico, montado para desmerecer e desqualificar uma notícia que os pobres leitores da Folha ainda terão que procurar muitas linhas abaixo, até chegar na profecia da Cassandra escolhida para anunciar o fim da tragédia.
Diz a matéria da Folha, em seu último parágrafo:
“Um dos indicadores que já sinalizam uma piora é a renda. De outubro para novembro, o rendimento, estimado em R$ 1.965,20, subiu 2%. Já em comparação com novembro de 2012, houve expansão de 3%, num ritmo menor do que nos meses anteriores.”
Ou seja, a piora virá porque, no último mês, a renda subiu 2% - ou 3%, se comparado a novembro de 2012.
Não é só ridículo, é perigoso.
Apesar dos pesares, quis dizer o jornal, no fim das contas, ainda não conseguimos destruir os sonhos nem restaurar o medo.
Triste constatar que, levados a este inferno de mágoas eleitorais pelas mãos de seus patrões, muitos jornalistas brasileiros se transformaram em especialistas na arte de transformar boas novas em presságios de mau agouro.
Parecem não perceber, mas vagam miseravelmente perdidos no vão ideológico em que se meteram, cada vez mais ignorados pela gente do País que mal disfarçadamente desprezam.