PAIXÕES DE CELULOIDE OU A QUEM INTERESSAR POSSA...
JOÃO GOMES
A pressão das mídias de direita sobre o Ministro Celso de Mello tem a expectativa de que este se curve aos apelos do que se publica (nanquim e celuloide), em ordem a proferir um voto que seja coincidente com os interesses políticos de seus patrões
Nunca antes na história deste país se percebeu, com tamanha nitidez, o despudorado uso das mídias para o exercício político e deslegitimo de pressão sobre o Poder Judiciário.
Que a ação penal 470, desde a sua instauração, já destilasse inegáveis contornos políticos (como bem esclareceu o Ministro Lewandowiski na discussão de recebimento da denúncia), isso não seria de surpreender a ninguém; Mas que estes contornos suplantariam a própria hipótese contida, isso não se poderia imaginar...
Deveras, passada a pantomima criada na última sessão, quando o Ministro Celso de Mello avisou que queria votar e que sua manifestação não consumiria mais do que cinco minutos e, ainda assim não pode fazê-lo (mudastes de opinião, Joaquim, acerca da necessidade de sermos céleres no julgamento?), como seria de se esperar, as mídias de direita se lançaram ao próximo projeto: satanizar a obediência à consciência no instante de decidir uma querela jurídica, ao tempo quem que se canoniza a atenção ao que chamam de opinião pública...
Neste contexto, indaga-se: O que é a opinião pública? Quem detém o controle de sua aferição e, principalmente, quem lhe pode manipular?
A catalisação da opinião pública (nos precisos contornos que ora se verifica) abandona qualquer hipótese de interesse público, abraçando um novel conteúdo impresso (nanquim no celuloide), que não se presta a externar os possíveis interesses da turba, na medida em que desloca o objeto da tutela em favor das vontades de quem lhe publica – afinal, quem pediu por Barrabás sequer conhecia as acusações tiradas contra o nazareno...
Neste contexto, foi Habermas quem estabeleceu o liame de convívio entre a ética e a moral nas sociedades, ao sustentar que ‘uma ação ou um juízo com o mesmo conteúdo, pode em um caso ser imoral e em outro moral, dependendo da forma que assume (...)’.
A pressão das mídias de direita sobre o Ministro Celso de Mello tem a expectativa de que este se curve aos apelos do que se publica (nanquim e celuloide), em ordem a proferir um voto que seja coincidente com os interesses políticos de seus patrões.
É o jogo e é do jogo, diriam alguns (e acredita Merval); Ocorre que esta mediocrização política não tem condão de afetar a dicção do direito em um estado democrático, suposto que o aplicador da lei não deveria ceder, jamais, aos interesses subjacentes, as paixões de aluguel, aos desejos e vontades estranhos a dogmática jurídica.
A própria sazonalidade dos interesses políticos justifica o acerto em favor da dogmática, na medida em que não bastaria (passadas três décadas da redemocratização) pedir desculpas pela colaboração com o regime de exceção (que torturou, matou e censurou), sem que estas desculpas venham (minimamente) acompanhadas de atos e de condutas, moralmente defensáveis e eticamente aceitáveis.
Este é o ponto: após toda a pressão das mídias, em defesa dos interesses de suas famílias mantenedoras (Frias, Mesquita, Civita e Marinho) querem, agora, na undécima hora, sublimar a própria história do Poder Judiciário, tangendo-o, amesquinhando-o, limitando-o, tornando-o (in)útil e descartável marionete repristinadora de anseios e interesses políticos...
Acende-se com este farol vermelho (para além das tintas da vergonha e da indecência – suposto que já se viram prostitutas em práticas mais éticas e em exercícios mais moralizadores) uma luz que abasteça as consciências, na medida em que ao longo de sua vida pública de Ministro da Corte Suprema, sobre Celso de Mello podem-se dizer várias coisas, exceto a que ele tenha, a qualquer tempo e em qualquer época, se acovardado.
Repousa, pois, sobre estes ombros largos de decano, a própria sobrevida do Estado de Direito, ao viés da preservação do entendimento de que, para o juiz no ato de decidir, saber distanciar-se da opinião publicada (nanquim e celuloide) separa a sujeira da bota...
Há quem sucumba e se preste a limpar a sujeira; Há, entrementes, os que se mantêm fiéis à própria história, jamais servindo de capacho no jogo midiático.
Com o Ministro Celso a palavra!
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