O Instituto Datafolha registrou nova pesquisa de intenção de votos que colherá esta semana, com resultado a ser divulgado no fim do mês, pouco tempo depois de ter realizado a enquete das séries que vem alternando, há anos, com os Institutos Sensus e Ibope. Certamente tem o objetivo de fotografar o momento preciso do empate técnico entre os dois candidatos em torno dos quais o eleitorado declarou preferências, e marcar o placar na data da desincompatibilização. E, a julgar pela curva ascendente registrada pela candidata do PT, Dilma Rousseff, o governo espera, além do empate técnico, a ultrapassagem do candidato do PSDB, José Serra, para ocupar o primeiro lugar.
Nem governo nem oposição estão sendo surpreendidos pelo fenômeno de resultado mais que perceptível de uma estratégia meticulosamente executada. O que as pesquisas registram até aqui é a história do crescimento da candidatura Dilma, e o que está fazendo os registros se moverem é o eleitorado do presidente Lula, os que gostariam de lhe ter dado o terceiro mandato. Bolsa Família, PAC, Minha Casa são instrumentos de exposição da candidata, canais, meios, discursos, marca, marketing. Com exceção do Bolsa, sequer registram resultados concretos. Por isso a invenção dos programas homônimos de número II, que se sobrepõem aos de número I, numa tentativa de renovar o elã.
O voto está vindo, mesmo, é de outra origem já identificada por especialistas. Estudos do cientista político e sociólogo Antonio Lavareda, agudo analista de pesquisas da MCI, com a experiência de 76 campanhas eleitorais, identificam este como sendo o voto no terceiro mandato transferido a Dilma.
A pergunta que jornalistas e analistas de dados eleitorais mais têm ouvido de empresários, do sistema financeiro, de investidores, diplomatas estrangeiros e até mesmo de políticos de interesses conflitantes entre si é se têm razão aqueles já engajados na tese de que a sucessão se definiu e está eleita a candidata do PT. Isto inclui dispensar a campanha dos adversários que deveriam desistir da disputa e arrumarem suas vidas em projetos ainda viáveis, deixando livre o espaço para a unção.
Como luta política é um caminho. A sério, um desrespeito. A conclusão não se sustenta, não tem substância científica a sete meses das eleições. A campanha efetiva, com a comparação de candidatos, o cotejo que permite ao eleitorado fazer opções, começa em julho com os debates, segue por agosto com a propaganda em televisão e rádio e se adensa também nesta etapa com a intensificação do bombardeio pela Internet.
O que se vê, agora, é uma campanha para tornar conhecida e, principalmente, associada ao presidente da República, a candidata Dilma Rousseff, para que se impregne nela o objeto do terceiro mandato que o eleitor de Lula gostaria de lhe dar.
Segundo Lavareda, qualquer analista que tente fazer uma análise o menos contaminada possível pelas suas preferências vai dizer que há circunstâncias determinantes da disputa e as principais, a reforçar o desempenho de Dilma, são o êxito da economia e a popularidade do atual governo.
Do outro lado, há o fato de o PT disputar um terceiro mandato com um candidato que não é o presidente Lula; isto, e mais as características básicas dos candidatos, como experiência, amadurecimento, carreira política, currículo denso, favorecem o candidato José Serra.
“Temos circunstâncias beneficiando a Dilma e características pessoais beneficiando o Serra. Esta campanha vai ser uma excelente oportunidade para ver o que vai preponderar.” Há exemplos recentes de sucesso e fracasso destas duas condições: no Chile, Michele Bachelet estava com 83% de popularidade e seu candidato Eduardo Frei foi derrotado; no Uruguai, Tabaré Vasquez tinha 64% de apoio e seu candidato José Mujica venceu.
A popularidade e a economia são importantes, mas não favoreceram o candidato da situação no Chile; já no Uruguai, a popularidade do presidente no cargo fez o sucessor.
Ainda entre as características determinantes deste pleito está a questão do “ciclo longo”.
Tomando como referência as eleições americanas, onde o analista vê uma série histórica, a partir de 1932, identifica que toda vez que um partido, seja o democrata ou o republicano, disputou eleição presidencial ao final de um ciclo longo (dois mandatos consecutivos) para ver se produzia o terceiro mandato, perdeu a eleição. Com exceção de 1988, com a vitória de George H. Bush (o pai) depois de dois mandatos de Ronald Reagan. Esticou por apenas mais um mandato.
“Ao fundo, ao fundo, termina aparecendo durante a campanha uma certa sensação de esgotamento”, comenta.
As circunstâncias pesam a favor de Dilma Rousseff. Seu crescimento é perfeitamente adequado à sua campanha, segundo avaliam aliados e adversários, embora estes, quando não tiveram seus interesses ainda acomodados, transmitam sentimentos de grande tensão e produção de factóides.
Dilma continuará crescendo porque sua fonte de intenções de votos não se esgotou. “Acho compreensível, primeiro pelo volume de exposição dela, mas não apenas isso. Havia um mercado potencial para ela crescer bastante. Que mercado era este? Pode-se falar em petismo, em adoração ao Lula, mas independentemente disso pode-se dizer que ela cresceu no eleitorado do terceiro mandato do Lula”, assinala Lavareda.
Os que gostariam de votar em Lula para um terceiro mandato, à medida em que vão tomando conhecimento que ele não é candidato mas tem uma candidata de sua escolha, aumentam as intenções de voto na ministra.
O universo do terceiro mandato é de 60%, segundo as últimas pesquisas. O desafio da ministra é manter o eleitorado que conquistou e crescer mais neste universo. Se ela conquistar todos, vencerá. Só a campanha, no cotejo com seu principal adversário, que tem suas características também favoráveis, terá condições de definir se, não sendo Lula, Dilma conseguirá realizar todo o seu mercado potencial.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
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